domingo, 28 de junho de 2009

Cântico dos cânticos

A autoria do livro CÂNTICO DOS CÂNTICOS é atribuída a Salomão. Trata-se de um poema em que se canta e exalta o amor humano como fruto de uma natureza sexuada e erótica. Aqui foi feita uma seleção dos trechos mais picantes do livro e de pequenos outros trechos do livro dos Provérbios, que segundo a ficção literária, também é de autoria de Salomão. Esta adaptação livre buscou ser o mais fiel possível ao texto original. Sua concepção foi feita por dois motivos. Primeiro, para demonstrar que o erotismo possui duas faces: uma profana e outra sagrada. Segundo, para divulgar esse que, sem dúvida, é um dos livros mais belos das sagradas escrituras. Bom deleite (por Coccinelle).

Durante a noite, no meu leito, busquei aquele que a minha alma ama. Procurei-o, mas não o encontrei. Levantei-me e percorri a cidade, as ruas e as praças, em busca daquele a quem a minha alma ama. Procurei-o e não o achei.

Encontraram-me os guardas que faziam a ronda na cidade. Perguntei-lhes: “Acaso viste aquele a quem a minha alma ama”?

Mal passara por eles, encontrei aquele a quem a minha alma ama. Apanhei-o e disse-lhe: “Ah! Beija-me com ósculos da tua boca! Porque os teus amores são mais deliciosos que o vinho, e suave é a fragrância dos teus perfumes”!

Eis que ele me respondeu: “Quão formosa e encantadora és, meu amor, minhas delícias. O teu porte assemelha-se ao da palmeira e os teus dois seios são os cachos. Subirei a palmeira e colherei teus frutos, que para mim são como cachos de uvas”.

Respondi: “Eu sou para o meu amado, e os seus desejos voltam-se para mim”.

Com lijonjas arrastei aquele a quem a minha alma ama para meus lábios e sabendo bem que um homem não pode esconder fogo em seu seio sem que suas vestes se inflamem, sussurei-lhe: “Vem, meu amado, saiamos para o campo, passemos a noite nos pomares; madrugaremos para ir às vinhas, e ver se a vinha lançou rebentos, se as flores se abrem, se as romãzeiras estão em flor. Ali te darei meus amores”!

“Os seus ardores são chamas de fogo”! Falou-me aquele a quem minha alma ama. Meu coração estremeceu.

“Vem"! Disse-lhe. "Embriaguemo-nos de amor até o amanhecer, gozemos as delícias da voluptuosidade”!

“Oh, como és bela, minha amada, como és formosa! Tenho a minha vinha diante de mim”!

Dizendo isto ele me seguiu imediatamente, como um veado colhido no laço. E juntos nos perdemos na imensidão do nosso amor.

domingo, 21 de junho de 2009

A mulher

Quando nasci um anjo esbelto, desses que tocam trombeta, anunciou: vai carregar bandeira. Cargo muito pesado pra mulher, esta espécie ainda envergonhada. Aceito os subterfúgios que me cabem, sem precisar mentir. Não sou tão feia que não possa casar, acho o Rio de Janeiro uma beleza e ora sim, ora não, creio em parto sem dor. Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina. Inauguro linhagens, fundo reinos - dor não é amargura. Minha tristeza não tem pedigree, já a minha vontade da alegria, sua raiz vai ao meu mil avô. Vai ser coxo na vida é maldição pra homem. Mulher é desdobrável. Eu sou”.

Este poema da ADÉLIA PRADO resume de forma incisiva o papel da mulher: a raiz das civilizações. Toda essa força e poder sempre atiçou a inveja do patriarcado, afinal, os homens não passam de meros inseminadores, papel deveras insignificante na trama da vida. Por conta disso, talvez, ao longo da história as mulheres sempre foram subjugadas, seja física ou emocionalmente. Mas é possível que essa situação não dure por muito mais tempo, pois as evidências têm mostrado que o patriarcado está com os seus dias contados. Graças a Deus ou ao Diabo (por Coccinelle).

domingo, 14 de junho de 2009

O medo

Desde crianças ouvimos conselhos que nos ensinam a ter cuidado. Cuidado com o nosso corpo, nossa alimentação, com as nossas palavras, nossos pensamentos, nossos sentimentos e desejos. Passamos a vida a ter cuidado. Mas tanto cuidado acaba abrindo caminho para o medo. Medo de doenças, da velhice, de insetos nojentos, medo do escuro, de nossas palavras, pensamentos, sentimentos, desejos, do diferente, da vida, enfim. São tantos os medos aprendidos e apreendidos ao longo de nossa existência que por vezes esquecemos de viver.

Viver implica em assumir riscos. Riscos que põem em cheque nossas convicções. Convicções que cremos serem verdades absolutas. Se estas são minimamente ameaçadas, grita-se, esperneia-se, foge-se, enclausura-se, mata-se. Nada pode abalar nossas convicções. Se, por exemplo, a morte abala nossa convicção de que somos superiores às baratas e nos dá a certeza do fim, inclusive do fim de toda e qualquer convicção, então, o melhor é fingir que ela não existe, seja silenciando ou acreditando na vida eterna. Se a morte é a angústia de quem vive, como já disse Vinícius de Moraes, crer na vida eterna é o remédio para amenizar essa angústia, que nada mais é do que o medo de descobrirmos que para o universo somos tão importantes quanto as pequeninas baratas. Há quem diga que o medo faz parte da natureza e que sua função é nos salvaguardar. Mas, salvaguardar de quê? (por Coccinelle).

domingo, 7 de junho de 2009

Vivas ao belo!

Constantemente ouvimos dizer que estamos vivendo tempos difíceis. É a crise econômica que sufoca, o desemprego que assusta, a miséria que humilha, a violência que aterroriza... Talvez estejamos mesmo vivendo uma época das mais difíceis. Como se não bastasse tanta dificuldade, ainda temos que conviver com a mediocridade que se alastrou pelo mundo, como uma daquelas sete pragas que assolaram o Egito, nos idos tempos de Moisés.

É espantoso constatar que nos dias atuais a mediocridade dá o tom. O tom dos debates políticos e ideológicos, das discussões e elocubrações acadêmicas, dos planejamentos estratégicos, das decisões existenciais, das mobilizações sociais, das preces apressadas, das coberturas midiáticas. É triste perceber que na contemporaneidade não há mais terrenos férteis onde possam vicejar em abundância talentos como Michelângelo, Shakespeare, Castro Alves, Guimarães Rosa ou Chaplin. Os holofotes de hoje só se voltam para o chulo, o grotesco, o fugaz, para o medíocre, enfim. Feito moscas que, mesmo em meio ao mais florido dos jardins, só têm olhos, narizes e bocas para a podridão.

Precisamos resgatar o belo. Não apenas o belo na sua forma artística, mas o belo nas suas mais variadas configurações. O belo nas idéias, na ciência, nos valores, nas emoções, nas relações e interações sociais, o belo em toda sua plenitude. O mundo contemporâneo está carente de beleza. Mais do que nunca o belo se faz desesperadamente necessário, pois urge darmos um basta ao sorriso cínico dos imbecis que, invariavelmente, se acham grande coisa. Abaixo os assassinos da beleza (por Coccinelle).

segunda-feira, 1 de junho de 2009

O retrato da intolerância

Há 109 anos morria de meningite em Paris aos 46 anos Oscar Wilde, escritor irlandês conhecido por sua brilhante oratória e, sobretudo, por seu talento literário.

Wilde, nascido em Dublin aos 16 de outubro de 1854, escreveu poemas, contos de fada como O Príncipe Feliz (1888), dedicado aos dois filhos, Cyril e Vyvyan, que teve com a bela Constance Lloyd, várias peças de teatro, a exemplo de Salomé (1891), O leque de Lady Windermere (1892), Uma mulher sem importância (1893), A importância de ser prudente (1895), Um marido ideal (1895), entre outras obras. Escreveu também o livro O retrato de Dorian Gray (1891), seu único romance.

O espírito aguçadamente irônico e mordaz de Oscar Wilde era bastante conhecido nos círculos literários e nos ricos salões londrinos. Suas pilhérias geralmente tinham como alvo o modo de vida preconceituoso e hipócrita da alta sociedade britânica, marcada por valores excessivamente utilitaristas e materialistas. Seu brilhantismo, objeto de admiração e temor, se fez conhecer ainda nos tempos em que estudava no Magdalen College de Oxford, onde permaneceu até 1879. Nessa época ele abraçou com entusiasmo os ideais estetas tão difundidos na universidade de Oxford. Por conta da sua habilidade retórica e seu poder de persuasão, foi convidado a fazer uma série de conferências sobre a doutrina esteticista nos Estados Unidos. Em 1882 aportou em Nova Iorque. Quando perguntado se tinha algo a declarar, respondeu: "Nada, além da minha genialidade". Ao final das conferências feitas em outras cinquenta cidades, acabou por conquistar o respeito e a admiração do público norte-americano.

Entre os anos de 1891 e 1895, as peças escritas por Wilde alcançaram enorme sucesso de público e crítica. Nesse mesmo período ele viveria um intenso relacionamento amoroso com o jovem aristocrata Lord Alfred Douglas, descrito por André Gide, amigo de Wilde, como uma pessoa "cínica, egoísta e terrível". Por causa dessa relação, Wilde passou a ser perseguido pelo pai do Lord Douglas, o Marquês de Queensberry, que o chamava de "sodomita" e o via como um "pervertido e corruptor".

Para livrar-se da perseguição que vinha sofrendo e, ao mesmo tempo, querendo atender aos caprichos do seu jovem amante, Wilde, a despeito dos inúmeros conselhos dos amigos, resolveu processar o marquês por injúria. Queensberry, em contrapartida, denunciou Wilde à Justiça por causa da sua homossexualidade, comportamento considerado criminoso na Inglaterra vitoriana. Após três julgamentos, Wilde foi condenado, em maio de 1895, a dois anos de prisão com trabalhos forçados. Em sua defesa disse à promotoria:

"O amor que não ousa dizer seu nome neste século é uma afeição tão grande entre um homem mais velho e um mais jovem como era entre Davi e Jônatas, da maneira como Platão o tornou a verdadeira base da sua filosofia, e da maneira como é encontrado nos sonetos de Michelângelo e Shakespeare...por conta disso, estou onde me encontro agora. É bonito, delicado. É a mais nobre forma de afeição. Não há nada de antinatural nele. É algo intelectual e existe repetidas vezes entre um homem mais velho e um mais jovem, quando o mais velho tem o intelecto, e o mais jovem toda a alegria, esperança e encanto da vida diante de si".

A sentença da Justiça Britânica fez Oscar Wilde conhecer de perto o inferno. Na prisão recebeu um tratamento desumano que o levou a um estado de profunda apatia. Em 1897, após ser libertado, partiu para a França com a saúde bastante debilitada. Já era um homem arruinado tanto moral quanto financeiramente. Seu nome fora proibido de ser estampado nos cartazes das suas peças, que em pouco tempo foram retiradas de cartaz. Sua esposa e filhos foram obrigados a mudar da Inglaterra e adotar o sobrenome Holland, ao invés de Wilde, para evitar constrangimentos e humilhações.
Abandonado por quase todos os amigos, inclusive pelo Lord Douglas, Oscar Wilde deixou para sempre a Grã-Bretanha, onde seu nome se tornou sinônimo de abjeção e vício, e suas idéias consideradas amorais, sobretudo porque eram antiutilitaristas. No dia 30 de novembro de 1900, morreu esquecido no modesto Hôtel d'Alsace, nas proximidades do Sena, vitimado, principalmente, pela intolerância dos seus contemporâneos (por Coccinelle).
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OSCAR WILDE EM ANIMAÇÃO
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A animação abaixo magnificamente produzida e executada resume de forma brilhante e bela a vida e a obra do Oscar Wilde. Vale a pena conferir.
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