segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Mensagem de Ano Novo

Final de ano, época de férias. Férias, sinônimo de preguiça. Estava eu a pensar o que postar, quando de repente me deparei com a mensagem de final de ano do blog Salvador na sola do pé, do meu amigo Sílvio Benevides. Gostei muito e por isso resolvi copiar e colar aqui, no melhor estilo Pappillon. Agradeço ao Sílvio por permitir colocar sua mensagem aqui e aproveito a oportunidade para desejar a todos e todas um excelente 2010. São os votos, sinceros, de COCCINELLE!

Em 2008, o Salvador na sola do pé encerrou o ano com uma série de manchetes veiculadas à época pelos meios de comunicação como uma maneira de refletir sobre os votos de felicidades comuns nesse período de virada de um ano para o outro. As manchetes não eram nada animadoras. A situação política, econômica e social no final do ano passado era bastante difícil. E hoje? Mudou? Creio que não. Dificuldades sempre existiram e continuarão a existir nesse ano e nos próximos que virão. Entretanto, não é sobre as dificuldades do mundo e da vida que desejo discorrer. Nesse final de ano me apropriei das palavras do poeta William Vicente Borges a fim de dizer o que eu desejo para 2010: “Que na sua vida... / Tudo tenha a beleza das flores, / Que não falte a luz do luar, / Que os amigos sejam todos sinceros, / Que o mar nunca se agite, mas se agitar / que o barco nunca afunde. / Que os beija-flores visitem / todos os dias o seu jardim, / Que os passarinhos cantem em sua janela, / Que os sorrisos se multipliquem / em sua face. / Que a inspiração renasça / a cada manhã. / Que teus sonhos sejam realizados, / Que seus dias de semana, sejam como o domingo. / Que o mal não chegue a porta da casa. / Que a tua dispensa esteja sempre abarrotada. / Que teus olhos só contemplem bondade, / Que cada passo teu seja iluminado por Deus. / Que todas as manhãs te recebam com um sorriso. É O QUE EU DESEJO”.

E para terminar o ano em grande estilo, um Poema Falado sobre o amor, Soneto CXVI, escrito por William Shakespeare. Como dizia um dos inúmeros grafites do Maio de 1968 francês: Faça amor, não faça guerra! Que 2010 traga muito amor e que todos tenham muito amor para dar e receber (por Sílvio Benevides).

domingo, 20 de dezembro de 2009

Rei Menino

No princípio já existia o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava, no princípio com Deus, tudo começou a existir por meio dele, e sem Ele, nada foi criado. Nele estava a Vida e a Vida era a luz dos homens. A luz resplandece nas trevas, mas as trevas não a admitiram. Surgiu um homem enviado por Deus, cujo nome era João. Veio como testemunha, para dar testemunho da luz, a fim de todos crerem por Seu intermédio. Ele não era a luz, mas veio para dar testemunho da luz. O Verbo era a luz verdadeira que, vindo ao mundo, a todo o homem ilumina. Estava no mundo, e o mundo foi feito por Ele, mas o mundo não O conheceu. Veio ao que era Seu e os Seus não O receberam, aos que crêem nele, deu-lhes o poder de se tornarem filhos de Deus. E o Verbo fez-se homem e habitou entre nós, e nós vimos a sua glória, glória que Lhe vem do Pai, como Filho único cheio de graça e de verdade. João dá testemunho dele e exclama nestes termos: “Este é Aquele de quem eu disse: o que vem depois de mim passou à minha frente porque existia antes de mim”. E a Sua plenitude é que todos nós recebemos, graça sobre graça. Porque, se a lei foi dada por meio de Moisés, a graça e a verdade vieram por meio de Jesus Cristo. Ninguém jamais viu Deus: o Filho único, que está no seio do Pai é que O deu a conhecer (Jo, 1:1-18).

O Natal significa para os cristãos do mundo inteiro a celebração pelo nascimento de Cristo, a celebração pela encarnação do Verbo. Verbo que instituiu o amor, o cuidado e o respeito ao próximo como o principal e mais importante dos seus mandamentos. Esse é o sentido do Natal para os cristãos. Ao menos deveria ser. Infelizmente, esse sentido está se perdendo e a principal personagem desta festa está, ano a ano, perdendo espaço para uma outra, que deveria passar de um mero figurante, o Papai Noel. O consumismo desenfreado de nossos tempos elevou Papai Noel à categoria de estrela maior do Natal. Quanto a Jesus e seu legado, este se perde pouco a pouco. Para tentar resgatar o real sentido dos festejos natalinos, o Poema Falado deste mês (excepcionalmente postado no domingo que antecede o Natal) traz um texto do Carlos Drummond de Andrade, Rei Menino, que diz: “O estandarte do Rei não é de púrpura e brocado, é um lírio flutuante sobre o caos, onde ambições se digladiam e ódios se estraçalham. O Rei vem cumprir o anúncio de Isaías: vem para evangelizar os brutos, consolar os que choram, exaltar os cobertos de cinza, desentranhar o sentido exato da paz, magnificar a justiça. Entre Belém e Judá e Wall Street, no torvelinho de negações e equívocos, a vergasta de luz deixa atônitos os fariseus. Cegos distinguem o sinal, surdos captam a melodia de anjos-cantadores, mudos descobrem o movimento da palavra. O Rei sem manto e sem jóias, nu como folha de erva, distribui riquezas não tituladas. Oferece a transparência da alma liberta de cuidados vis. As coisas já não são as antigas coisas de perecível beleza e o homem não é mais cativo de sua sombra. A limitação dos seres foi vencida Por uma alegria não censurada, graça de reinventar a Terra, antes castigo e exílio, hoje flecha em direção infinita. O Rei, criança, permanecerá criança mesmo sob vestes trágicas porque assim o vimos e queremos, assim nos curvamos diante do seu berço tecido de palha, vento e ar. Seu sangrento destino prefixado não dilui a luminosidade desta cena. O menino, apenas um menino, acima das filosofias, da cibernética e dos dólares, sustenta o peso do mundo na palma ingênua das mãos”. Boa leitura e um ótimo Natal!
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domingo, 13 de dezembro de 2009

Da amizade como modo de vida

De l'amitié comme mode de vie. Entrevista de Michel Foucault a R. de Ceccaty, J. Danet e J. le Bitoux, publicada no jornal Gai Pied, nº 25, abril de 1981, pp. 38-39. Tradução de Wanderson Flor do Nascimento.

Gai Pied – Você é quinquagenário. É um leitor deste jornal que existe há dois anos. O conjunto destes discursos te parece algo de positivo?

Que o jornal exista é algo de positivo e importante. Ao seu jornal, o que eu pediria era que, lendo, eu não tivesse que colocar a questão da minha idade. Entretanto, a leitura me força a colocá-la. E eu não fiquei muito contente com a maneira como fui levado a fazê-lo. Muito simplesmente, eu não teria lugar ali.

Gai Pied - Quem sabe o problema seja da faixa etária dos que nele colaboram e dos que o lêem: uma maioria entre 25 e 35 anos.

Certamente. Quanto mais é escrito por pessoas jovens, mais diz respeito às pessoas jovens. Mas o problema não é ceder lugar a uma faixa etária de um lado a outro, mas saber o que se pode fazer em relação à quase identificação da homossexualidade com o amor entre jovens. Outra coisa da qual é preciso desconfiar é a tendência de levar a questão da homossexualidade para o problema "Quem sou eu? Qual o segredo do meu desejo?" Quem sabe, seria melhor perguntar: "Quais relações podem ser estabelecidas, inventadas, multiplicadas, moduladas através da homossexualidade?" O problema não é o de descobrir em si a verdade sobre seu sexo, mas, mais importante que isso, usar, daí em diante, de sua sexualidade para chegar a uma multiplicidade de relações. E essa, sem dúvida, é a razão pela qual a homossexualidade não é uma forma de desejo, mas algo de desejável. Temos que nos esforçar em nos tornar homossexuais e não nos obstinarmos em reconhecer que o somos. É para essa direção que caminham os desenvolvimentos do problema da homossexualidade, para o problema da amizade.

Gai Pied - Você pensou isso aos 20 anos ou descobriu no decorrer dos anos?

Tão longe quanto me recordo, desejar rapazes é desejar relações com rapazes. E isso foi sempre, para mim, algo importante. Não forçosamente sob a forma do casal, mas como uma questão de existência: Como é possível para homens estarem juntos? Viver juntos, compartilhar seus tempos, suas refeições, seus quartos, seus lazeres, suas aflições, seus saberes, suas confidências? O que é isso de estar entre homens, "despidos", fora das relações institucionais, de família, de profissão, de companheirismo obrigatório? É um desejo, uma inquietação, um desejo-inquietação que existe em muitas pessoas.

Gai Pied - Pode-se dizer que a relação com o desejo, com o prazer e a relação que alguém pode ter, seja dependente de sua idade?

Sim, muito profundamente. Entre um homem e uma mulher mais jovem, a instituição facilita as diferenças de idade, as aceita e as faz funcionar. Dois homens de idades notavelmente diferentes, que código terão para se comunicar? Estão um em frente ao outro sem armas, sem palavras convencionais, sem nada que os tranquilize sobre o sentido do movimento que os leva um para o outro. Terão que inventar de A a Z uma relação ainda sem forma que é a amizade: isto é, a soma de todas as coisas por meio das quais um e outro podem se dar prazer. É uma das concessões que se fazem aos outros de apenas apresentar a homossexualidade sob a forma de um prazer imediato, de dois jovens que se encontram na rua, se seduzam por um olhar, que põem a mão na bunda um do outro e fiquem devaneando por um quarto de hora. Esta é uma imagem comum da homossexualidade que perde toda a sua virtualidade inquietante por duas razões: ela responde a um cânone tranqüilizador da beleza e anula o que pode nesse encontro vir a inquietar no afeto, carinho, amizade, fidelidade, coleguismo, companheirismo, aos quais uma sociedade um pouco destrutiva não pode ceder espaço sem temer que se formem alianças, que se tracem linhas de força imprevistas. Penso que é isto o que torna "perturbadora" a homossexualidade: o modo de vida homossexual muito mais que o ato sexual mesmo. Imaginar um ato sexual que não seja conforme a lei ou a natureza, não é isso que inquieta as pessoas. Mas que indivíduos comecem a se amar: ai está o problema. A instituição é sacudida, intensidades afetivas a atravessam; ao mesmo tempo, a dominam e perturbam. Olhe o exército: ali o amor entre homens é, incessantemente, convocado e honrado. Os códigos institucionais não podem validar estas relações das intensidades múltiplas, das cores variáveis, dos movimentos imperceptíveis, das formas que se modificam. Estas relações instauram um curto-circuito e introduzem o amor onde deveria haver a lei, a regra ou o hábito.

Gai Pied - Você costuma dizer: "mais que chorar por prazeres esfacelados, me interessa o que podemos fazer de nós mesmos". Poderia explicar isso melhor?

O ascetismo como renúncia ao prazer tem má reputação. Porém a ascese é outra coisa. É o trabalho que se faz sobre si mesmo para transformar-se ou para fazer aparecer esse si que, felizmente, não se alcança jamais. Não seria este o nosso problema hoje? Demos férias ao ascetismo. Temos que avançar em uma ascese homossexual que nos faria trabalhar sobre nós mesmos e inventar – não digo descobrir – uma maneira de ser, ainda improvável.

Gai Pied - Isso quer dizer que um jovem homossexual deveria ser muito prudente em relação à produção da imagem homossexual e trabalhar sobre outra coisa?

Isso no que devemos trabalhar, me parece, não é tanto em liberar nossos desejos, mas em tornar a nós mesmos infinitamente mais suscetíveis a prazeres. É preciso, insisto, é preciso escapar das duas fórmulas completamente feitas sobre o puro encontro sexual e sobre a fusão amorosa das identidades.

Gai Pied - Podem-se ver premissas de construções relacionais fortes nos EUA, sobretudo, nas cidades onde o problema da miséria sexual parece resolvido?

O que me parece certo é que nos EUA, mesmo se no fundo a miséria sexual ainda exista, o interesse pela amizade tem se tornado muito importante. Não se entra simplesmente na relação para poder chegar à consumação sexual, o que se faz muito facilmente; mas aquilo para o que as pessoas são polarizadas é a amizade. Como chegar, por meio das práticas sexuais, a um sistema relacional? É possível criar um modo de vida homossexual? Esta noção de modo de vida me parece importante. Não seria preciso introduzir uma diversificação outra que não aquela devida às classes sociais, às diferenças de profissão, de níveis culturais, uma diversificação que seria também uma forma de relação e que seria o “modo de vida"? Um modo de vida pode ser partilhado por indivíduos de idade, estatuto e atividade sociais diferentes. Pode dar lugar a relações intensas que não se pareçam com nenhuma daquelas que são institucionalizadas e me parece que um modo de vida pode dar lugar a uma cultura e a uma ética. Acredito que ser gay não seja se identificar aos traços psicológicos e às máscaras visíveis do homossexual, mas buscar definir e desenvolver um modo de vida.

Gai Pied - Não é uma mitologia dizer: “Eis-nos, talvez, dentro das premissas de uma socialização entre seres, que é inter-classes, inter-idades, inter-nações”?

Sim, um grande mito como dizer: não haverá mais diferenças entre a homossexualidade e a heterossexualidade. Por outro lado, penso que é uma das razões pelas quais a homossexualidade se torna um problema atualmente. Acontece que a afirmação de que ser homossexual é ser um homem e que este se ama, esta busca de um modo de vida vai ao encontro desta ideologia dos movimentos de liberação sexual dos anos sessenta. Nesse sentido os "clones" bigodudos têm uma significação. É um modo de responder: "Não receiem nada, quanto mais se seja liberado, menos se amará as mulheres, menos se fundirá nesta polissexualidade onde não há mais diferença entre uns e outros." E não se trata, de modo algum, da idéia de uma grande fusão comunitária. A homossexualidade é uma ocasião histórica de reabrir virtualidades relacionais e afetivas, não tanto pelas qualidades intrínsecas do homossexual, mas pela posição de "enviesado", de alguma forma, as linhas diagonais que ele pode traçar no tecido social, as quais permitem fazer aparecerem essas virtualidades.

Gai Pied - As mulheres poderiam objetar: "O que os homens entre eles ganham em relação às relações possíveis entre um homem e uma mulher ou entre duas mulheres?”.

Há um livro que apareceu nos EUA sobre a amizade entre as mulheres [FADERMAN, Lillian. Surpassing the Love of Men. New York: William Marrow, 1980]. É muito bem documentado a partir de testemunhos de relações de afeição e paixão entre mulheres. No prefácio, a autora diz que ela havia partido da idéia de detectar as relações homossexuais e se deu por conta de que essas relações não somente não estavam sempre presentes, mas que não era interessante saber se se poderia chamar a isso de homossexualidade ou não. E que, deixando a relação desdobrar-se tal como ela aparece nas palavras e nos gestos, aparecem outras coisas bastante essenciais: amores, afetos densos, maravilhosos, ensolarados ou mesmo, muito tristes, muito sombrios. Este livro mostra também até que ponto o corpo da mulher desempenhou um grande papel e os contatos entre os corpos femininos: uma mulher penteia outra mulher, ela a ajuda a se maquiar e se vestir. As mulheres tinham direito ao corpo de outras mulheres, segurar pela cintura, abraçar-se. O corpo do homem estava proibido ao homem de maneira mais drástica. Se é verdade que a vida entre mulheres era tolerada, é somente em certos períodos e a partir do séc. XIX que a vida entre homens foi, não somente tolerada, mas rigorosamente obrigatória: simplesmente durante as guerras. Igualmente nos campos de prisioneiros. Havia soldados, jovens oficiais que passaram meses, anos juntos. Durante a guerra de 1914, os homens viviam completamente juntos, uns sobre aos outros, e, para eles isso não era nada, na medida em que a morte estava ali; e de onde vinha finalmente a devoção de um ao outro, o serviço prestado era sancionado por um jogo de vida e morte. Fora algumas frases sobre o coleguismo, sobre a fraternidade da alma, de alguns testemunhos muito parciais, o que se sabe sobre furacões afetivos, sobre essas tempestades do coração que puderam haver ali nesses momentos? E alguém pode perguntar o que fez que nessas guerras absurdas, grotescas, nesses massacres infernais, as pessoas, apesar de tudo, tenham se sustentado? Sem dúvida, um tecido afetivo. Não quero dizer que era porque eles estavam amando uns aos outros que continuavam combatendo. Mas a honra, a coragem, a dignidade, o sacrifício, sair da trincheira com o companheiro, diante do companheiro, isso implicava uma trama afetiva muito intensa. Isto não quer dizer: "Ah, está ai a homossexualidade!" Detesto este tipo de raciocínio. Mas, sem dúvida, se tem ai uma das condições, não a única, que permitiu suportar essa vida infernal em que as pessoas, durante semanas, rolassem no barro, entre os cadáveres, a merda, se arrebentassem de fome; e estivessem bêbadas na manhã do ataque. Eu queria dizer, enfim, que qualquer coisa refletida e voluntária, como uma publicação, deveria tornar possível uma cultura homossexual, isto é, possibilitar os instrumentos para relações polimorfas, variáveis, individualmente moduladas. Mas a idéia de um programa e de proposições é perigosa. Desde que um programa se apresenta, ele faz lei, é uma proibição de inventar. Deveria haver uma inventividade própria de uma situação como a nossa e dessa vontade que os americanos chamam de comming out, isto é, de se manifestar. O programa deve ser vazio. É preciso cavar para mostrar como as coisas foram historicamente contingentes, por tal ou qual razão inteligíveis, mas não necessárias. É preciso fazer aparecer o inteligível sobre o fundo da vacuidade e negar uma necessidade; e pensar que o que existe está longe de preencher todos os espaços possíveis. Fazer um verdadeiro desafio inevitável da questão: o que se pode jogar e como inventar um jogo?

Gai Pied - Obrigado, Michel Foucault.

domingo, 6 de dezembro de 2009

AIDS, cultura e mulheres

01 de dezembro é o dia escolhido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) como a data símbolo de combate ao HIV/AIDS. Desde os primeiros casos na década de 1980 até hoje muitos avanços ocorreram e muitas mudanças também. Atualmente, as mulheres estão mais vulneráveis ao contágio do que os homens. Na maioria dos casos por conta dos hábitos e costumes preservados por muitas culturas. Existem ainda, no mundo inteiro, várias práticas e tradições culturais que aumentam o risco de os jovens contrairem HIV/AIDS. Na maior parte das vezes, estas práticas e tradições afetam os jovens mais do que os adultos e o sexo feminino mais do que o masculino.

A situação da mulher

Em muitas sociedades, as mulheres são ensinadas e obrigadas a subordinar seus próprios interesses aos de seus parceiros. Sob tais expectativas, as jovens sentem-se freqüentemente impotentes para se proteger contra a infecção do HIV e contra a gravidez não intencional. Também é comum que as adolescentes sofram coerção e abuso sexual. No Quênia, 40% das estudantes secundárias e sexualmente ativas declararam ter sido forçadas ou enganadas a ter relações sexuais. Muitas vezes, as jovens acabam concordando com o ato sexual por medo de que, se recusarem, serão estupradas de qualquer maneira.

O abuso conjugal das mulheres é muito disseminado. Em alguns países, mais de 40% das mulheres já foram atacadas por seus próprios parceiros. A violência de um sexo contra o outro está intimamente relacionada ao HIV/AIDS. Por exemplo, em Ruanda, as mulheres soropositivas, cujo parceiro é também soropositivo, têm maior probabilidade de informar casos de coerção sexual em seu relacionamento do que as mulheres não soropositivas. Na Tanzânia, a violência perpetrada por parceiros era 10 vezes mais comum entre as mulheres soropositivas do que entre as soronegativas. Muitas mulheres não ousam lembrar aos parceiros a possibilidade do uso de preservativos para a proteção contra o HIV, pois temem sofrer abusos físicos.

Práticas matrimoniais

Em muitas culturas a importância dada à procriação leva geralmente aos casamentos adolescentes e à maternidade precoce. Meninas de pouco mais de 10 anos são oferecidas em casamento a homens mais velhos como forma de solidificar certos relacionamentos e laços econômicos entre famílias.

Quando garotas desta faixa de idade se casam com homens mais velhos, elas ficam mais vulneráveis à infecção do HIV porque seus maridos já tiveram uma série de outras parceiras sexuais. As barreiras sociais, políticas e religiosas geralmente escondem do mundo estas jovens esposas, enquanto seus maridos frequentemente dispõem de outras parceiras sexuais. A poliginia, prática do homem ter várias esposas, é freqüente em alguns países. Na África, quando o marido busca uma nova esposa, geralmente mais jovem, ele provavelmente experimenta várias mulheres sexualmente durante o processo e, assim, arrisca trazer o HIV para seu próprio lar. Em algumas culturas, existe a herança de esposas, uma tradição pela qual uma esposa é oferecida a um cunhado após a morte do marido. Assim, um deles pode estar se expondo ao risco de HIV se o outro estiver infectado. As viúvas mais jovens correm risco especial porque têm maior probabilidade de buscar ou ser buscadas por outros parceiros sexuais.

Em algumas sociedades, o pagamento do dote matrimonial é obrigatório quando um homem se casa. Em certas regiões da África, o homem paga este dote à família da esposa. Depois de selado o casamento com o dote, a mulher é considerada “paga” e, geralmente, não pode nunca abandonar o marido, mesmo que surjam problemas no casamento. Assim, mesmo que o comportamento do marido a coloque sob alto risco de infecção de HIV, a mulher não terá como se proteger.

Ritos de passagem

Os ritos culturais de passagem da infância à idade adulta, apesar de servirem tradicionalmente para unir as comunidades, pode aumentar os riscos de contrair o HIV. Por exemplo, as circuncisões masculinas e femininas são às vezes realizadas usando instrumentos não esterilizados. Os pesquisadores consideram que a circuncisão masculina reduz os riscos de transmissão do HIV ao remover parte do prepúcio, que é particularmente vulnerável ao HIV. Mas, em algumas comunidades, as cerimônias de circuncisão são às vezes acompanhadas de experiências sexuais de iniciação, as quais aumentam os riscos de contrair o HIV. Por exemplo, entre os Maasai da África Oriental, o relacionamento entre amigos é tão forte que, depois da circuncisão, os iniciados compartilham esposas e amantes.

Práticas sexuais

Algumas práticas sexuais tais como o sexo seco – inserção de objetos para secar a vagina ou torná-la mais resistente – pode provocar cortes e abrasões que criam aberturas para a passagem do HIV. Outras práticas, tais como os exames de virgindade de mulheres, tornam a castidade um prêmio tão cobiçado que muitas mulheres não casadas são levadas a praticar somente o coito anal, arriscando-se, assim, muito mais a contrair o HIV/AIDS do que se praticassem o coito vaginal.

FONTE: Population Reports, published by the Population Information Program, Center for Communication Programs, The Johns Hopkins School of Public Health.

domingo, 29 de novembro de 2009

Vida fácil: hipocrisia social?

Muitas vezes, a afirmação de que a prostituição é a “profissão mais antiga do mundo” tem uma conotação evasiva e vaga, já que não permite uma definição mais clara acerca do desenvolvimento histórico e social desta atividade. Assim, parece possível e corriqueiro usar o termo “profissão” para uma atividade tantas vezes considerada marginal ou de segunda classe, sem situar a sua “antiguidade” e outras nuances.

Os anos 80 assustaram-se com a constante divulgação de um novo fenômeno dentro da indústria sexual: a PROSTITUIÇÃO MASCULINA. Causando ao mesmo tempo perplexidade, curiosidade e asco, a poderosa televisão, as artes e a Ciência passaram a trazer à tona a existência desta prática, durante tanto tempo negligenciada.

A epidemia de AIDS em muito contribuiu para o desvelo desta vertente da atividade de prostituição. Partiu-se subitamente da chamada liberdade sexual para a vigilância sexual, pois enquanto doença sexualmente transmissível, precisava encontrar seus vilões, os verdadeiros culpados pela expansão da “peste”. Desta forma, os michês seriam bons culpados: teriam um comportamento eminentemente bissexual, servindo de vetores na transmissão entre a população homossexual e a chamada população em geral.

A constante veiculação da existência da prática da prostituição masculina provocou a imediata necessidade de definição das características deste grupo social específico: afinal de contas, como seria o michê? O termo, há muito usado nos meios homossexuais, passou a ganhar uma relativa transparência social e extrapolar os guetos. A imprensa, de uma maneira geral, ocupou-se de veicular um perfil do michê, contribuindo para satisfazer as fantasias e a curiosidade gerais: o michê seria um rapaz normalmente musculoso, esportista, bronzeado, com todas as características do típico playboy da zona sul carioca, Normalmente cobrariam bastante alto por suas transações, seriam extremamente viris e invejados pela maioria dos demais homens, o que se concretizaria na sua postura super macho man.

Logo em seguida, passa a ser veiculada uma nova visão do michê, a do assassino de homossexuais. Este ponto, primeiramente denuncia o comportamento homossexual dos michês, já que fica garantida a imagem de que grande parte dos clientes são homens; em seguida colabora para a construção do preconceito social, associando sua imagem a violência, quase sempre extrema, injustificada e com requintes de crueldade. Toda uma celeuma junto aos homossexuais, usuários ou não dos serviços do michê.

Nossa experiência de quase três anos com diferentes grupos de michês no Rio de Janeiro mostra uma realidade um pouco diferente. É necessária uma imediata desmistificação daquela imagem outrora divulgada, o michê não tem necessariamente a forma física descrita pela imprensa e desejada por muitos. Grande é a sua surpresa quando se constata que o michê pode ser qualquer rapaz, com ou sem o exagero do masculino e sem inatingibilidade dos deuses do Olimpo. Jovens com aparência típica de rapazes de subúrbio, sem roupas ou tênis de marcas famosas, algumas vezes com um certo estereótipo de meninos de rua também podem estar envolvidos na prostituição.

Importante esta constatação de que é difícil conceituar o grupo dos rapazes envolvidos na prostituição masculina. Certamente não há características que permitam uma definição do grupo ou mesmo de seus membros, tampouco de sua atividade. O contato direto os seus “favores sexuais” por muito menos do que se imagina ou por muito mais do que necessita. Passamos a ser contra uma delimitação específica ou uma definição à priori do grupo.

Não são poucas, contudo, as áreas em que se desenvolve a prostituição masculina no Rio. Algumas já famosas, como a Galeria Alaska, o Bar Maxim's, a Cinelândia, a Via Ápia. Outras que congregam as chamadas “marginalidades” e permitem, num contrato implícito, que a pegação se insinue e a michetagem permaneça. Por mais que sejam diferentes as características destas áreas e por mais personagens que participem deste cenário, certo é que ali sempre estão os atores principais: o michê e o cliente, que iniciam ali sua peça cujo epílogo quase sempre se dá na cama.

E é na cama que a delimitação exigida pode desfazer ou reforçar fantasias. Diz-se que “entre quatro paredes tudo é permitido”, embora isto seja muitas vezes negado. Pouco importa. Fato é que se consuma o prazer e que certamente este não é unilateral.

Grande parte das vezes é efêmera a permanência na prostituição, muitas destas o tempo suficiente para uma maior compreensão de sua própria sexualidade ou de outras fontes de renda. Soma-se a isto o desejo despertado no cliente, que tende a reduzir com o aumento da idade.

Muitas são também as diferenças entre os que optam pela prostituição nas ruas e pela chamada prostituição fechada, em saunas, casas de massagem, hot-lines e similares. A prostituição fechada pressupõe uma maior profissionalização da atividade, o que não é fácil para a maioria, que acaba optando pelas ruas.

Algumas curiosidades nos confirmam que a prostituição masculina não é um “fenômeno” assim tão problemático para muitas famílias. Durante nosso trabalho no Programa “Pegação” pudemos perceber que há uma forma de desenvolvimento da atividade que conta com a plena cumplicidade das famílias de muitos rapazes: as chamadas “casas de tias”. São casas, sempre nos subúrbios e periferia, administradas por homossexuais de uma certa idade (as “tias”) e nas quais os rapazes das redondezas se prostituem para clientes abonados da zona sul. Muitas vezes as famílias incentivam, levam os rapazes e consideram a atividade de “comer viado” uma boa forma de engordar a renda familiar sem comprometer a masculinidade de seus pupilos (por Paulo Henrique Longo).

domingo, 22 de novembro de 2009

Um personagem gay na turma do Mauricio de Sousa

Um novo personagem de Mauricio de Sousa está gerando polêmica e movimentando o Twitter do criador da Turma da Mônica. Caio, apresentado como o melhor amigo de Tina em “O triângulo da confusão”, história da 6ª edição da revista lançada pela Panini, é o primeiro personagem aparentemente gay criado pelo autor. Na trama, Caio assume ser comprometido, apontando para outro rapaz. Outros personagens ficam surpresos com a revelação (veja imagem ao fim da postagem).

“A revista ‘Tina’ é uma nova publicação dirigida a um público adulto jovem, não tem nada a ver com a Turma da Mônica ou o público infantil ou infanto-juvenil”, escreveu Mauricio de Sousa em sua página no Twitter. “A história que está provocando celeuma deve ser lida e interpretada pelo leitor”.

“Repito, a revista ‘Tina’ é uma nova publicação dirigida a um público adulto jovem. Lida a história, feita a interpretação, daí sim, comentários e críticas poderiam ajudar para falarmos a língua de uma sociedade esclarecida, lembrando que publicações dirigidas a faixas de idade diferenciadas podem e devem tratar qualquer assunto de maneira adequada ao seu leitor”, escreveu.

“Na TV, no cinema, nas revistas das bancas, há a separação por faixa de idade. Por que não haveria na nossa vasta galeria de publicações? Mas uma coisa vai se manter em todas as nossas produções: o respeito pelo ser humano. Pela pessoa. E a elegância no trato de qualquer tema”, comentou o autor (Fonte: G1).

A história cumpre as promessas de Maurício de Sousa em abordar de uma forma tranqüila temas importantes do universo adolescente sem, no entanto, levantar bandeiras. A assessoria do Maurício de Sousa também afirma ser possível que Caio seja bissexual e garante que ele voltará às histórias da Tina. Nesta edição há também um discurso de Tina, agora estudante de jornalismo, contra todas as formas de preconceito. São os ventos das mudanças. Que sejam bem-vindos!


















domingo, 15 de novembro de 2009

Declaração dos direitos sexuais

Sexualidade é uma parte integral da personalidade de todo ser humano. O desenvolvimento total depende da satisfação de necessidades humanas básicas tais quais desejo de contato, intimidade, expressão emocional, prazer, carinho e amor.

Sexualidade é construída através da interação entre o indivíduo e as estruturas sociais. O total desenvolvimento da Sexualidade é essencial para o bem estar individual, interpessoal e social.

Os direitos sexuais são direitos humanos universais baseados na liberdade inerente, dignidade e igualdade para todos os seres humanos. Saúde sexual é um direito fundamental, então saúde sexual deve ser um direito humano básico. Para assegurarmos que os seres humanos e a sociedade desenvolva uma sexualidade saudável, os seguintes direitos sexuais devem ser reconhecidos, promovidos, respeitados e defendidos por todas sociedades de todas as maneiras. Saúde sexual é o resultado de um ambiente que reconhece, respeita e exercita estes direitos sexuais.

Durante o XV Congresso Mundial de Sexologia, ocorrido em Hong Kong (China), entre 23 e 27 de agosto p.p., a Assembléia Geral da WAS – World Association for Sexology, aprovou as emendas para a Declaração de Direitos Sexuais, decidida em Valência, no XIII Congresso Mundial de Sexologia, em 1997.

O DIREITO À LIBERDADE SEXUAL – A liberdade sexual diz respeito à possibilidade dos indivíduos em expressar seu potencial sexual. No entanto, aqui se excluem todas as formas de coerção, exploração e abuso em qualquer época ou situações de vida.

O DIREITO À AUTONOMIA SEXUAL, INTEGRIDADE SEXUAL E À SEGURANÇA DO CORPO SEXUAL – Este direito envolve a habilidade de uma pessoa em tomar decisões autônomas sobre a própria vida sexual num contexto de ética pessoa e social. Também inclui o controle e p prazer de nossos corpos livres de tortura, multilação e violência de qualquer tipo.

O DIREITO À PRIVACIDADE SEXUAL – O direito às decisões individuais e aos comportamentos sobre intimidade desde que não interfiram nos direitos sexuais dos outros.

O DIREITO A LIBERDADE SEXUAL – Liberdade de todas as formas de discriminação, independentemente do sexo, gênero, orientação sexual, idade, raça, classe social, religião, deficiências mentais ou físicas.

O DIREITO AO PRAZER SEXUAL – prazer sexual, incluindo autoerotismo, é uma fonte de bem estar físico, psicológico, intelectual e espiritual.

O DIREITO À EXPRESSÃO SEXUAL – A expressão é mais que um prazer erótico ou atos sexuais. Cada indivíduo tem o direito de expressar a sexualidade através da comunicação, toques, expressão emocional e amor.

O DIREITO À LIVRE ASSOCIAÇÀO SEXUAL – significa a possibilidade de casamento ou não, ao divórcio, e ao estabelecimento de outros tipos de associações sexuais responsáveis.

O DIREITO ÀS ESCOLHAS REPRODUTIVAS LIVRES E RESPONSÁVEIS – É o direito em decidir ter ou não ter filhos, o número e tempo entre cada um, e o direito total aos métodos de regulação da fertilidade.

O DIREITO À INFORMAÇÃO BASEADA NO CONHECIMENTO CIENTÍFICO – A informação sexual deve ser gerada através de um processo científico e ético e disseminado em formas apropriadas e a todos os níveis sociais.

O DIREITO À EDUCAÇÃO SEXUAL COMPREENSIVA – Este é um processo que dura a vida toda, desde o nascimento, pela vida afora e deveria envolver todas as instituições sociais.

O DIREITO A SAÚDE SEXUAL – O cuidado com a saúde sexual deveria estar disponível para a prevenção e tratamento de todos os problemas sexuais, precauções e desordens.

Acción afirmativa contra la homofobia

Soy lesbiana declarada y vivo fuera del armario desde noviembre de 1996, cuando salí con Isabel, mi pareja, en un Programa de TV de esos que se llaman de testimonio. He sido Presidenta de COGAM, en 1998. Fui a COGAM para salir del armario en Política y me fui de COGAM para encabezar la lista de Los Verdes a la Comunidad de Madrid y participar en un proyecto de reconstrucción de una alternativa de izquierdas y verde, no dogmática, para el Parlamento Europeo en colaboración con otros partidos. No he abandonado la Política, ni la militancia civil no violenta. Lo que he dejado atrás son las siglas y las disciplinas de partido.

Isabel y yo estuvimos apoyando la reivindicación de La Ley de Parejas, desde el principio, y apoyamos el matrimonio civil, que parece estar a la vuelta de la esquina, aún a riesgo de ser tachadas de "carcas", porque consideramos que la equiparación en los derechos civiles es de justicia, sobre todo teniendo en cuenta que vivimos en un contexto social determinado que no puede obviarnos, ni desentenderse de nuestra existencia, puesto que contribuimos "a escondidas", pero realmente, a su desarrollo y riqueza, con nuestros impuestos, con nuestro trabajo, etc.. Nos tiene que reconocer, respetar y favorecer en igualdad de condiciones sin penalizarnos por nuestra orientación lésbica ó gay.

Pero no dejo de ser consciente de que tanto la Ley de Parejas como el Matrimonio Civil como reivindicaciones, en el caso de existir y de poder acogernos a ellas, sólo van a beneficiar y a resolver la vida a aquellas parejas de lesbianas o de gays que así lo decidan de acuerdo con sus intereses personales específicos. Seamos el porcentaje que seamos, no se dará en el 100% de los casos, pues no todas las lesbianas, ni todos los gays tienen pareja con la que pensar y plantearse estas cosas. Quienes decidamos contraer matrimonio civil habremos conseguido la plena igualdad jurídica, el fin de la discriminación legal, pero ¿habremos conseguido la igualdad real? y ¿qué pasará con la gente que no tiene pareja?, ¿qué pasará con l@s adolescentes que están descubriendo su homosexualidad sin ningún referente o con referentes negativos en los colegios? ¿cómo se consigue que en aquellos ámbitos en donde la homosexualidad no está fuera del armario y es evidente, pasé a manifestarse?

El día que se autorice el matrimonio entre personas del mismo sexo, los gays y las lesbianas no saldrán en masa del armario, los homófobos no les abrazarán diciéndoles de corazón "¡ya ha terminado vuestra pesadilla! ¡os queremos como sois!." Ni los gays y lesbianas se olvidarán ese día repentinamente de su pasado, se liberarán alegremente del trauma acumulado, ni se comportarán de pronto como si su homosexualidad nunca hubiera sido motivo de marginación y humillación, como si nunca hubieran tenido nada que esconder. No. Nada de eso ocurrirá.

Por eso, hace tiempo que, desde mi nueva situación de independencia, vengo planteando la necesidad de crear otros foros de debate y otros temas de reivindicación, desde el convencimiento de que hará falta más, mucho más, que la autorización del matrimonio para conseguir la igualdad real. Será necesario un programa especial de acción social y política de apoyo a lesbianas y gays, un programa que sea tan contundente en lo positivo como lo ha sido la sociedad hasta ahora en lo negativo.

Como ecofeminista tengo claro que, legislar con el objetivo de acabar con la discriminación, es imprescindible, pero nunca un fin en sí mismo. Sólo las "acciones positivas" que han establecido cupos o preferencias de la mujer frente al hombre han sido instrumentos eficaces, aplicados durante un tiempo, para conseguir en la práctica "condiciones de paridad" desde las que empezar a construir otro mundo no patriarcal ni machista. Sólo las campañas de sensibilización pública a todos los niveles han conseguido situar en el nivel justo el debate. Por ello, pienso que sólo "acciones positivas" aplicadas en beneficio de lesbianas o gays van a poder incidir en un cambio de mentalidad real y, lo que es más importante, en una diferente valoración de la orientación lesbiana y gay. Dicho de otro modo, la igualdad, la igualdad real, no va a venir con una palmadita en la espalda y una declaración oficial de que ya somos iguales.

Los gays y lesbianas, como grupo social, estamos debilitados por la sistemática política de terror y chantaje a que se nos somete desde la infancia. Esa debilidad se traduce en miedo, miedo a hablar, miedo a darse a conocer, miedo a dar la cara. Y ese miedo hace que no contemos con suficiente fuerza para defender nuestros derechos. Para invertir esta situación, es necesario aplicar un intenso programa que premie de diferentes maneras la manifestación pública de nuestra orientación lésbica o gay, que refuerce con apoyo económico a los medios de comunicación lésbicos y gays, que son los que nos sirven para articular un discurso público de defensa de nuestros derechos, y a nuestras organizaciones sociales.

Hacen falta campañas públicas de sensibilización respecto de la realidad lésbica y gay, a los problemas y marginaciones que sufrimos. Hace falta que la gente se entere de las nefastas consecuencias que ello tiene para las vidas de millones de personas. Es imprescindible acabar con los estereotipos que se manejan cotidianamente, que no se juzgue de manera negativa a quiénes se disfrazan o "travisten" en las marchas en favor del Orgullo Gay-Lesbiano, como no se juzga, ni se consideran "pervertid@s" a quiénes en los carnavales hacen lo propio y cambian sus indumentarias habituales. Mientras no se consiga desconectar socialmente que no tiene por qué influir en la profesionalidad de un/una médic@ o de un/una abogad@, la pluma que ést@ tenga, ni en su capacidad para ser una buena madre o un buen padre, habrá que seguir reivindicando espacios de libertad. El hecho de que a estas alturas de la historia estemos empezando a atisbar el fin de las discriminaciones legales contra nosotr@s, si algo demuestra es precisamente la penosa situación de opresión en que aún se desarrollan nuestras vidas en lo cotidiano, por ello lo más importante que hay que cambiar es el día a día, cualquier acto sencillo de nuestra existencia.

Me preocupa pensar que el tiempo que reste hasta que el Partido Popular deje el Gobierno o decida legislar esta discriminación evidente e insostenible, las lesbianas y los gays, individualmente, y los Colectivos que supuestamente representan nuestros intereses, centren su actividad pública en la equiparación legal y olviden que el trabajo real está en los colegios, las universidades, las empresas, los medios de comunicación, etc.

Creo que los Partidos Políticos, además de llevar en sus propuestas electorales medidas de equiparación legal, tendrán que plantear políticas reales para la compensación de las injusticias que se han infligido a las lesbianas y a los gays en el transcurso de la historia. Tendrán que incluir en sus listas a lesbianas y gays declarad@s para que en los Parlamentos y en los Ayuntamientos empiece a haber una representación proporcional de gays y de lesbianas y hasta contratar en sus estructurales profesionales a asesor@s especializad@s que sean homosexuales. Me refiero también a los medios de comunicación y a su obligación de producir todo tipo de programas: películas, series, debates, informativos con referentes positivos homosexuales. A los planes de estudio que tendrán que dar cabida como materia básica de conocimiento temas relacionados con la realidad lesbiana ó gay, con la formación de la personalidad, etc. Y proporcionar referencias históricas positivas no estereotipadas. Pienso, también, en los ámbitos universitarios en los que se tendrá que potenciar la investigación sobre cuestiones de carácter lésbico y gay, hasta la fecha desatendidos. De modo y manera que, en todos los estratos sociales, en un pueblo como en una ciudad, en cualquier comunidad autónoma, en las empresas públicas como en las privadas, en los colegios, incluso religiosos, en las universidades y en las familias, obviamente, hasta en el último rincón se persigan los prejuicios y se extermine la homofobia latente que está tan asumida.

Todo esto es lo que se ha dado en llamar "acción afirmativa" y sólo conseguiremos este cambio, que tiene que ver con una idéntica valoración de la orientación homosexual, si se comienza ya a llevar a cabo y a hacer extensivo éste o cualquier otro plan de "acciones afirmativas".

Si esto suena utópico e inalcanzable es que nuestra igualdad real también es utópica e inalcanzable, pero yo no creo que lo sea. Basta con ponerse en marcha cuanto antes, pues se trata de nuestra propia dignidad que nos exige seguir luchando por la igualdad. La igualdad real (por Ana Segura).

domingo, 8 de novembro de 2009

Amor não tem sexo

Esta, ainda que pareça ser uma afirmativa chocante, é absolutamente verdadeira. O amor não tem sexo, não tem idade, não tem cor, não tem fronteiras, não tem limites. O amor não tem nada disso, mas tem tudo. Corresponde ao sonho de felicidade de todos, tanto que existe uma parcela de felicidade que só se realiza no outro. Ninguém é feliz sozinho. Como diz a música, é impossível ser feliz sozinho, sem ter alguém para amar.

Essa realidade começou a adquirir tamanha visibilidade, que o amor passou a ter relevância jurídica e acabou ingressando no ordenamento jurídico. Em um primeiro momento, só o casamento chancelava o envolvimento afetivo, verdadeiro sacramento para a Igreja, sendo considerado pelo Estado a instituição-base da sociedade.

Com a evolução dos costumes e a quebra de inúmeros preconceitos e tabus, não mais foi possível deixar de ver o surgimento de novos relacionamentos, muitas vezes formados pelos partícipes dos vínculos oficializados desfeitos. Esses novos núcleos, sem nome e sem lei, foram no Judiciário objeto de conhecimento. Ainda que de forma tímida e conservadora – mais por não conseguir a Justiça conviver com a mais chocante injustiça, que é o enriquecimento injustificado –, o afeto começou a receber respaldo jurisdicional. No princípio, confundindo-se amor com lavor, viram-se nas relações chamadas concubinárias verdadeiros vínculos empregatícios. Depois, identificadas como sociedades de fato, o que nada mais era do que uma sociedade de afeto, as relações extramatrimoniais foram inseridas no campo do Direito Obrigacional, um negócio jurídico, com base no art. 1.363 do CC, verdadeira combinação de esforços ou recursos para lograr fins comuns.

Mas dito respaldo judicial acabou por fazer a Constituição Federal alargar o conceito de família, abrangendo não mais exclusivamente o casamento, mas também o que chamou de união estável, além de emprestar o nome de entidade familiar às relações de um dos pais com seus filhos.

Embora vanguardista, o conceito de família cunhado pela Lei Maior ainda é acanhado, pois não logrou envolver vínculos afetivos outros, que não correspondem ao paradigma convencional identificado pelo casamento com sexo e reprodução. Ora, se os métodos contraceptivos e os movimentos feministas concederam à mulher o livre exercício da sexualidade; se passaram a ser considerados família os relacionamentos não identificados pelo casamento; se, no atual estágio da evolução da engenharia genética, a reprodução não mais depende da ocorrência de contato sexual, imperioso que se busque um novo conceito de família.

A identificação da presença de um vínculo amoroso, que leva o envolvimento de sentimentos ao enlaçamento das vidas, é o que basta para que se reconheça a existência de uma família. Como já afirmava Saint Exupéry, você é responsável pelas coisas que cativa. E é esse envolvimento a causa da incidência do Direito de Família, levando ao surgimento de encargos e obrigações, mas também concedendo direitos e prerrogativas a quem passa a comungar da mesma vida.

Se basta o afeto para se ver uma família, nenhum limite há para seu reconhecimento. A presença de qualquer outro requisito ou pressuposto é desnecessária para sua identificação.
Essa nova concepção tem levado cada vez mais a sociedade a conviver com todos os tipos e espécies de relacionamento, mesmo que não mais correspondam ao modelo tido como "oficial". Mas ainda é alvo de acirrada polêmica e causa verdadeira rejeição social a possibilidade, ora legalmente chancelada pela Holanda, de os casais homossexuais adotarem crianças. Essa resistência mostra a inaceitação de tais vínculos, que, no entanto, como qualquer outro, têm o afeto como razão de existir. Em nome da preservação do menor, por medo de que seja alvo da repulsa no ambiente escolar ou por temer comprometimento de ordem psicológica, por falta de referências definidas que lhe sirvam de modelo, acaba-se perpetrando verdadeiros infanticídios.

Há uma realidade da qual não se pode fugir. Crianças vivem com parceiros do mesmo sexo, quer por serem concebidas de forma assistida, quer por serem filhos de somente um deles. Presente a convivência, a negativa de adoção veda a possibilidade do surgimento de um vínculo jurídico com ambos, o que, ao invés de benefícios, só acarreta prejuízos ao filho. Mesmo tendo dois pais ou duas mães, a vedação de chancelar dita situação serve tão-só para impedir, em caso de morte, a percepção de direitos sucessórios ou benefícios previdenciários. Se ocorrer a separação, não haverá direito a alimentos, não se podendo garantir o direito de visitas.

Por isso é que merece ser louvada a iniciativa da Holanda, que, de forma corajosa, pensou muito mais no interesse dos menores do que nos preconceitos da sociedade. Garantiu o nascimento de filhos frutos do afeto, gerados de forma responsável, cercando-os da proteção legal.

Essa é, com certeza, a consagração do amor sem estigmas e sem medos, concedendo a muitos menores abandonados a chance de se criarem de forma saudável e feliz, pois cercados de um amor que já não tem mais medo de dizer seu nome e no seio de uma família que merece ser chamada de homoafetiva (por Maria Berenice Dias. In: Âmbito Jurídico, mar/2001).

Heterossexuality is not normal; it’s just common.”
Dorothy Parker

domingo, 1 de novembro de 2009

Liberdade

Uma antiga propaganda de jeans dizia que liberdade é uma calça velha azul e desbotada que se deve usar do jeito que o indivíduo quiser. Essa idéia além de indicar que a liberdade não requer elucubrações sofisticadas para ser compreendida, indica também que ela significa uma possibilidade de se fazer aquilo que se quer conforme se escolha. Ser livre, portanto, consiste na possibilidade de escolha, que, uma vez feita, pode ser repetida sempre que se queira de acordo com a situação. O poeta Fernando Pessoa traduziu esse pensamento da seguinte maneira: “Ai que prazer não cumprir um dever. Ter um livro para ler e não o fazer! Ler é maçada. Estudar é nada. O sol doira sem literatura. O rio corre, bem ou mal, sem edição original. E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal, como tem tempo não tem pressa... Livros são papéis pintados com tinta. Estudar é uma coisa em que está indistinta a distinção entre nada e coisa nenhuma. Quanto é melhor, quando há bruma, esperar por D. Sebastião, quer venha ou não! Grande é a poesia, a bondade e as danças... Mas o melhor do mundo são as crianças, flores, música, o luar, e o sol, que peca só quando, em vez de criar, seca. O mais do que isto é Jesus Cristo, que não sabia nada de finanças nem consta que tivesse biblioteca...LIBERDADE é o tema do poema falado deste mês. Boa Leitura!


domingo, 25 de outubro de 2009

Senado do Uruguai aprova lei de mudança de sexo

O Senado do Uruguai aprovou, no último dia 12 de outubro, uma lei que permite a mudança de sexo e de nome no país. “Toda pessoa tem o direito de desenvolver livremente sua personalidade de acordo com a identidade de seu gênero, independentemente de sua identidade biológica, genética ou anatômica”, diz o texto aprovado pelo Senado. No mês passado, a Câmara dos Deputados havia aprovado a lei, chamada de Lei de Identidade de Gêneros, que regula os procedimentos para a troca de gênero a partir dos 18 anos de idade. A legislação permitirá aos interessados mudar de nome e gênero em seus documentos oficiais. Para ser sancionada, a lei agora deve ser assinada pelo presidente Tabaré Vázquez.

OUTRAS MEDIDAS

No mês passado, o Uruguai se tornou o primeiro país da América Latina a autorizar a adoção por casais homossexuais. O governo do presidente Tabaré Vázquez - o primeiro líder de esquerda a assumir a Presidência do Uruguai - aprovou em maio o acesso dos homossexuais às escolas militares do país. Em 2008, o governo também aprovou a união civil entre homossexuais. Apesar disso, a inclinação liberal do governo encontra críticos dentro do país. Em entrevista ao canal de televisão Univision, o arcebispo de Montevidéu, Nicolas Cotugno, afirmou que “o tema da adoção de crianças por homossexuais se refere essencialmente à natureza humana e conseqüentemente se trata de ir contra os direitos fundamentais do ser humano enquanto pessoa”. O porta-voz da ONG Coordinadora Nacional por la Vida, Nestor Martinez também criticou a medida em entrevista ao jornal uruguaio El País, na qual afirmou que a legalização da adoção gay “constitui um retrocesso e um atentado aos direitos das crianças” (Notícia retirada do site da BBC Brasil).

Que os bons ventos uruguaios soprem e se espalhem pelas mais longínquas paragens e rincões latino-americanos.

domingo, 18 de outubro de 2009

Descobrir-se é descolar-se

Descobrir-se é descolar-se. Descolar-se implica deixar para trás as lembranças de uma vida que uma vez rompida não se refaz jamais. Descobrirmo-nos homossexuais, por exemplo, significa rompermos barreiras, convenções, medos, receios, afetos que, ao revelarmo-nos, revelam-se meras ilusões. Quantas foram as dores que amarguei, foram tantas que nem sei, ao perceber faces queridas afastarem-se de mim ou mesmo me evitarem. Tudo isso devido ao meu desejo safo cuja natureza contraria o pai, aborrece a mãe, a esposa, o esposo, os filhos, os irmãos, o mundo, enfim. Mas não me queixo das dores as quais experimentei, afinal, vida sem dor é o mesmo que morte. Somente os mortos estão imunes à dor. Ademais, da dor nascem os anticorpos que nos fortalecem. E assim fortalecidos seguimos descolando-nos. Por isso, cara amiga, não te entristeça se as borboletas que sempre voltearam perto de ti já não volteiam como outrora. Saiba que nos jardins da vida novas borboletas chegam a toda hora. Basta olhar ao seu redor para percebê-las em revoada rumo a flor que tanto aprecias (por Coccinelle).

domingo, 11 de outubro de 2009

“William Blake é meu guia espiritual” (Allen Ginsberg)

Mas quem é esse tal William Blake? Um pássaro? Um avião? Talvez um Gênio cuja espada flamejante escancara as portas da percepção. Nascido na Inglaterra em 1757, Blake, esse Gênio genial, é considerado uma das grandes vozes da poesia inglesa. Além de escrever, também pintava e atuava como impressor. Por conta de seus trabalhos de impressão Blake figura como um dos mais importantes gravadores da história da Inglaterra. Morou em Londres, sua terra natal, praticamente por toda a vida. Sua obra está toda impregnada por uma aura mística e religiosa. Aos quatro anos ocorrem as primeiras manifestações de vidência. O então menino avistou a face de Deus em sua janela. Assustou-se e deu um grito. Mais tarde, quando passeava por campos verdejantes, deparou-se com uma árvore repleta de anjos cujas asas refletiam as cores do arco-íris (que belo!) e mais adiante viu o profeta Ezequiel calmamente sentado. Ao relatar suas visões para a mãe, levou uma surra. Aos dez anos foi enviado à escola de desenho. Aos catorze, tornou-se aprendiz do gravador James Basire. Ainda na adolescência, começou a escrever poesia. Em 1782, casa-se com Catherine Sophia Boucher, com quem costumava brincar de Adão & Eva (que maravilha!). Como um bom libertário, que não se prende a convenções que impossibilitam a percepção da vida, ensinou sua esposa a ler e escrever e ambos passam a trabalhar juntos na publicação dos poemas de Blake desde o lançamento da primeira coletânea, Poetical Sketches, de 1783. Ao longo de toda a sua vida, William Blake reclamou sobre a falta de reconhecimento de seu trabalho, mas percebeu logo que não estava só. Escreveu, então, um desabafo: "Até Milton e Shakespeare não puderam publicar seus trabalhos". Notabilizou-se pelos desenhos que fez para ilustrar a Divina Comédia, de Dante, nos quais trabalhou até os últimos dias de vida, que ocorreram em 1827. O essencial, embora invisível, foi vagamente dito. E continuará sendo dito em outras ocasiões mais. Mas quem é mesmo esse tal de Allen Ginsberg que aparece no título dessa postagem? Isso é outra história. Fica para outra ocasião (por Coccinelle).

domingo, 4 de outubro de 2009

Poema Falado - Oração pela Paz

Oração – “Oh Senhor, faze de mim um instrumento da tua paz: / Onde há ódio, faze que eu leve Amor; / Onde há ofensa, faze que eu leve Perdão; / Onde há discórdia, que eu leve União; / Onde há dúvida, que eu leve a Fé; / Onde há erro, que eu leve a Verdade; / Onde há desespero, que eu leve a Esperança; / Onde há tristeza, que eu leve a Alegria; / Onde há trevas, que eu leve a luz. / Oh Mestre, faze que eu procure menos / Ser consolado do que consolar; / Ser compreendido do que compreender; / Ser amado do que amar. / Porquanto é dando que se recebe; / É perdoando que se é perdoado; / É morrendo que se ressuscita para a Vida Eterna” (tradução de Manuel Bandeira).

SÃO FRANCISCO AINDA VIVE ENTRE NÓS - São Francisco de Assis (1181-1226) é venerado em todo o mundo como uma das figuras das quais mais nos orgulhamos. Na sua biografia se tornaram visíveis e possíveis sonhos carregados ao longo de toda a vida e acalentados no fundo de nosso coração: uma relação amorosa e terna com Deus, Pai e Mãe de infinita bondade, um amor simples a todas as coisas, vivenciadas como irmãos e irmãs; uma discreta reconciliação entre os impulsos do coração e as exigências do pensamento, feitos próximos, e dos próximos feitos irmãos; uma aceitação jovial daquilo que não podemos mudar; uma inocente liberdade em face das ordens e regras estabelecidas; uma alegra acolhida da morte como amiga da vida.

São Francisco inundou a esfera humana de espírito de benquerença, fraternura e paz, que continuou a ressoar com o passar dos tempos até nossos dias. Em sua homenagem igrejas, cidades, escolas, rios, instituições e pessoas carregam o nome de São Francisco.

Mais ainda: há comportamentos, símbolos, idéias e sonhos que reportam naturalmente a São Francisco como se ele próprio fosse seu autor. E isso não sem razão, porque ele continua a viver como arquétipo nas mentes e nos corações das pessoas e de muitos movimentos culturais, na não-violência, na fraternidade universal, na jovialidade, no amor aos animais e na ecologia, expressões importantes da busca espiritual da cultura de nossa época.

Existe uma espiritualidade franciscana difusa no espírito de nosso tempo, nascida da experiência de Francisco, de Clara e de seus primeiros companheiros. Trata-se do caminho da simplicidade, da descoberta de Deus na natureza, do amor singelo a todas as criaturas, da confiança quase infantil na bondade das pessoas e na imperturbável alegria, mesmo em face dos dramas mais pungentes da vida humana.

A Oração pela Paz também chamada de Oração de São Francisco constitui uma das cristalizações desta espiritualidade difusa. Ela não provém diretamente da pena do Francisco histórico, mas da espiritualidade do São Francisco da fé. Ele é seu pai espiritual e por isso seu autor no sentido mais profundo e abrangente desta palavra. Sem ele, com certeza, essa Oração pela Paz jamais teria sido formulada nem divulgada e muito menos teria se imposto como uma das orações mais ecumênicas hoje existentes. Ela é rezada por fiéis de todos os credos e por professantes de todos os caminhos espirituais.

Ela tem o condão de unir a todos num mesmo espírito de paz e de amor. Por um momento faz sentir que todos somos de fato irmãos e irmãs na grande família humana e cósmica e também filhos e filhas da família divina.

Vamos aprofundar o teor dessa Oração pela Paz para revelar sua riqueza insuspeitada e para despertar o Francisco e a Clara que dormem dentro de cada um de nós (por Leonardo Boff).

Referências:

BANDEIRA, Manuel. Meus poemas preferidos. São Paulo: Ediouro, 2002.

BOFF, Leonardo. A Oração de São Francisco: uma mensagem de paz para o mundo atual. Rio de Janeiro: Sextante, 1999.

POEMA FALADO – ORAÇÃO DE SÃO FRANCISCO PELA PAZ

domingo, 27 de setembro de 2009

Por uma reforma gramatical!

Os mais conservadores alegam que as militantes feministas costumam ser radicais, pois se queixam e reclamam de tudo, ou seja, vivem procurando chifre em cabeça de cavalo, piolho em cobra e cabelo em casca de ovo. Será? Então vejamos: o machismo da nossa sociedade se reflete até mesmo na gramática. Quer ver só? Quando a maioria das pessoas presentes em um lugar qualquer é formada por mulheres, como fica o plural? Sempre masculino, mesmo que haja apenas um ou dois homem em um grupo de cinqüenta mulheres. Quer ver de novo? Observe só o tratamento machista (que recebi por e-mail) existente na gramática portuguesa das ruas e digam se as feministas tem ou não razão.

CÃO – melhor amigo do homem.
CADELA – puta.

VAGABUNDO – homem que não faz nada.
VAGABUNDA – puta.

TOURO – homem forte.
VACA – puta.

PISTOLEIRO – homem que mata pessoas.
PISTOLEIRA – puta.

AVENTUREIRO – homem que se arrisca, viajante, desbravador.
AVENTUREIRA – puta.

GAROTO DE RUA – menino que vive na rua.
GAROTA DE RUA – puta.

HOMEM DA VIDA – pessoa letrada pela sabedoria adquirida ao longo da vida.
MULHER DA VIDA – puta.

HOMEM PÚBLICO – políticos ou administradores públicos.
MULHER PÚBLICA – puta.

O GALINHA – o “picudo”, que traça todas.
A GALINHA – puta.

TIOZINHO – irmão mais novo do pai.
TIAZINHA – puta.

FEITICEIRO – profundo conhecedor de alquimias.
FEITICEIRA – puta.

ROBERTO JEFFERSON, ZÉ DIRCEU, PAULO MALUF, JADER BARBALHO, EURICO MIRANDA, JOSÉ SARNEY – políticos (?!).
A MÃE DELES – putas.

PUTO – nervoso, irritado, bravo.
PUTA – puta.

Depois de ler esta postagem:
HOMEM – vai sorrir.
MULHER – vai ficar puta.

Por que o que não presta é sempre atribuído à puta? E por que putaria é sempre sinônimo de balbúrdia e de algo que não se deve levar à sério? E que mal há em ser puta? Ai, ai, viu! Durma com um barulho desses... (por Coccinelle)

domingo, 20 de setembro de 2009

A luz que não se apaga

Luz del Fuego Nasceu em 21 de fevereiro de 1917, ano da Revolução Russa, em Cachoeiro do Itapemirim, no Estado do Espírito Santo, numa madrugada de carnaval. Fora batizada com o nome de Dora Vivacqua. Era a décima quinta filha de Antônio Vivacqua e Etelvina Vivacqua.

Em 1929, após passar alguns anos morando em Belo Horizonte, sua família decide voltar para a cidade de Cachoeiro. Por essa época, Dora já estava entrando na adolescência e seu gênio forte começava a se revelar, não aceitando ordens ou opiniões de ninguém sobre sua vida.

Em 1932 ocorre o assassinato do seu pai por antigos inquilinos, que dias antes ele havia despejado de um dos seus vários terrenos. Dora estava com quinze anos e se sentia sufocada na pequena cidade de Cachoeiro. Para ela, até mesmo a capital, Vitória, parecia-lhe sufocante. Queria ir para o Rio de Janeiro, então capital federal. Abominava o uso do sutiã. Desfilava pela praia de Marataízes de calcinha e bustiê improvisado com lenços, numa época em que o biquíni sequer era imaginado. Com a morte do esposo, Etelvina decide voltar para Belo Horizonte. Dora vai junto, mas logo em seguida viaja para o Rio de Janeiro sob a tutela de seu irmão Attilio.

Em 1936, Dora já com 19 anos, inicia um romance com José Mariano Carneiro da Cunha Neto, membro de uma das mais importantes famílias do Rio de Janeiro. Seu irmão Attilio, que era contra o namoro, a despacha de volta para a casa da família em Minas Gerais. Esse retorno vai marcar definitivamente a vida de Dora.

De volta à casa materna, Dora passa a ser assediada e molestada pelo cunhado Carlos, um dos maiores empreiteiros do Brasil à época e esposo da sua irmã Angélica. Certo dia, Angélica flagra seu marido bolinando a irmã no quarto do casal. A maior parte da família preferiu acreditar nas mentiras de Carlos e tomou Dora como esquizofrênica. Isso lhe custou dois meses de internação no Hospital Psiquiátrico Raul Soares, em Belo Horizonte, e dez quilos a menos.

Sabendo do acontecido, seu irmão Achilles proibiu Carlos de freqüentar a casa dos Vivacqua (o que aconteceu até que Achilles morresse em dezembro de 1942). Preocupado com o estado que Dora deixou o hospital, Achilles consegue convencê-la a passar uma temporada na fazenda de Archilau, um dos seus irmãos mais velhos.

Na fazenda do irmão Dora tinha total liberdade. Um dia apareceu estilizada de Eva – com três folhas de parreira presa nos seios e no púbis, além de duas cobras-cipós como braceletes – para o filho do administrador da fazenda, responsável em acompanhá-la onde quer que fosse. Quando repreendida por Archilau, atirou-lhe um vaso de cristal na testa. Toda esta rebeldia causou uma segunda internação, desta vez na Casa de Saúde Dr. Eiras, famosa clínica psiquiátrica do Rio de Janeiro. Mais uma vez seu irmão Achilles intervém, levando-a para morar com a irmã Mariquinhas em Cachoeiro.

Em 1937 Dora decide fugir para o Rio de Janeiro. De volta à capital federal, ela retoma seu romance com Mariano, porém não aceita oficializar a relação. Resolve se tornar pára-quedista, mas Mariano a proíbe. Apaixonada, interpreta a proibição do namorado como uma demonstração de amor. As desavenças e o fim do romance começaram a ocorrer de fato quando Dora decidiu fazer um curso de dança na academia Eros Volúsia.

Em 1944 Dora se torna uma artista. Sua estréia ocorreu no picadeiro do Circo Pavilhão Azul, em companhia do casal de jibóias Cornélio e Castorina. O nome que inicialmente adotava era o de Luz Divina. A figura exótica da personagem de Dora era reforçada pelas chamadas do apresentador do espetáculo: "E atenção, senhoras e senhores! Chegou o momento da grande atração da noite! Com vocês, a única, a exótica, a mais sexy e corajosa bailarina das Américas! Luz Divina e suas incríveis serpentes!". A platéia delirava.

Em 1947 nasce Luz del Fuego, personagem que imortalizaria Dora Vivacqua. Por sugestão do amigo e palhaço Cascudo, Luz Divina se transformou em Luz del Fuego, nome de um batom argentino recém-lançado no mercado. Segundo seu amigo, nomes estrangeirados atraíam mais o público. Dora acatou de imediato a sugestão, pois acreditava que a imagem do fogo marcava o início de uma nova vida e o fim daquela que anteriormente levava.

Por já haver tirado vários circos da falência com seus espetáculos, o casal Juan Daniel e Mary Daniel, donos do Follies, um pequeno teatro em Copacabana, resolveu contratar Luz del Fuego. Suas falas – que nunca decorava – ficavam sob responsabilidade de um jovem membro da família que, aos doze anos, ingressava na carreira artística, o hoje conhecido diretor Daniel Filho.

O espetáculo Mulher de Todo Mundo, estrelado por Luz, fez muito sucesso. As notas na imprensa começaram a aparecer com grande freqüência. Mesmo desvinculada do nome Vivacqua, as atividades de Luz causavam incômodo à família. Seu irmão Attilio havia sido eleito senador da república e uma irmã dançarina, de acordo com os padrões vigentes na época, depunha contra a moral de um homem público. Não bastasse isso, Luz resolveu publicar seu diário com o título de Trágico Black-Out. Trechos comprometedores, como a sedução pelo cunhado, e fatos que aludiam a uma prostituição assumida davam o tom do livro. Attilio conseguiu comprar mais da metade da edição (cerca de mil exemplares) para colocar fogo nos volumes. No final da sua autobiografia, Luz anunciava um segundo livro com o sugestivo nome de Rendez-vous das Serpentes.

No início dos anos 50 as idéias naturistas vinculadas à prática do nudismo, apresentadas em Trágico Black-Out, começaram a ser vivenciadas por Luz. Começou a reunir um pequeno grupo de amigas na praia de Joatinga, próximo à sua casa na avenida Niemeyer. Apesar de ser uma praia deserta devido ao difícil acesso, Luz sempre ia à praia acompanhada dos amigos Domingos Risseto, Miss Gilda e Miss Lana (estes últimos, transformistas), alguns cães e o casal de jibóias Cornélio e Castorina, segundo ela, sua maior garantia contra os abelhudos. Na concepção de Luz, "Um nudista é uma pessoa que acredita que a indumentária não é necessária à moralidade do corpo humano. Não concebe que o corpo humano tenha partes indecentes que se precisem esconder". Assim, ela começou a tornar públicas suas idéias a cerca do nudismo-naturalismo num país onde o uso do maiô de duas peças nas praias não era sequer cogitado e o culto ao corpo se resumia aos concursos de Miss.

Apesar de praticar o nudismo numa praia absolutamente deserta e de difícil acesso, a polícia ainda assim, julgou imoral tal prática e acabou prendendo todos os nudistas. Luz percebeu então que o nudismo colocaria suas idéias em evidência. Publicou mais um livro autobiográfico, A Verdade Nua, no qual lançava as bases de sua filosofia naturista. A família, desta vez, não precisou se preocupar, pois as próprias autoridades se encarregaram de dar sumiço à obra. A segunda edição foi vendida por reembolso postal. A renda seria destinada à aquisição de uma ilha na qual instalaria a sede de seu clube naturista.

Luz del Fuego causava furor onde se apresentava. Do Rio de Janeiro, passou a ser conhecida em todo o Brasil, chegando até mesmo a ser capa da famosa revista norte-americana Life. Seus shows eram garantia de bilheteria certa e levavam todos ao delírio. Era o tempo das vedetes: Mara Rúbia, Virgínia Lane e Elvira Pagã, sua maior rival.

Luz doava rendas de seus espetáculos para instituições beneficentes, fazendo leilões de si mesma. Foi multada e detida para interrogatórios inúmeras vezes. Quando era liberada pela polícia, saía alardeando em praça pública que as autoridades que insistentemente ordenavam sua detenção (delegados, juizes, prefeito) se comportavam de maneira muito duvidosa, porque, segundo ela, um homem de verdade não se ofende com a nudez de uma mulher, pois sabe apreciar a beleza do corpo feminino. Por causa dessas declarações era detida por desacato à autoridade.

Seus irmãos começavam a projetar seus nomes em diversas áreas da vida social, principalmente na política, no comércio e nas artes. O parentesco com a escandalosa Luz del Fuego passou a ser algo incômodo para eles, que passaram a persegui-la sem trégua. Attilio comprava edições inteiras das revistas em que Luz aparecia e a culpou por ter perdido as eleições para governador do Espírito Santo (durante a campanha, seu adversário alardeava pelo interior do Estado que o senador Vivacqua era irmão de uma mulher suja e demoníaca).

Luz se aproveitava da situação. Quando necessitava de dinheiro, ameaçava dançar nua nas escadarias do Senado. Attilio a chamava de chantagista, mas ela retrucava, alegando que estava apenas cobrando a parte da herança paterna que os irmãos lhe haviam surrupiado.

Juntamente com seu amigo e parceiro de palco, Domingos Risseto, Dora, à custa de espetáculos gratuitos que fazia seminua nas escadarias do Teatro Municipal, criou o PNB - Partido Naturalista Brasileiro. Seu irmão Attilio, no entanto, graças à sua influência política, conseguiu impedir o registro do partido.

A fim de conseguir a concessão de uma ilha para a sede de sua colônia naturista, Dora seduziu o Ministro da Marinha, que lhe concedeu uma ilha em Tapuama de Dentro. Dois terços da ilha, de seus oito mil metros quadrados, eram formados por rochas, cactos e arbustos secos. Dora se sentiu enganada. Teve vontade de desistir, mas como isto não era de sua natureza, fundou nesse lugar aparentemente inóspito a famosa e polêmica Ilha do Sol.

A Ilha do Sol foi o primeiro recanto naturista publicamente conhecido no Brasil e, por conseqüência, criticado indiscriminadamente. Passou a ser uma das grandes atrações turísticas do Rio de Janeiro, apesar de não fazer parte dos roteiros oficiais. Várias estrelas do cinema americano conheceram a ilha: Errol Flynn, Lana Turner, Ava Gardner, Tyrone Powel, César Romero, Glenn Ford, Brigitte Bardot e Steve MacQueen, que encerrou sua temporada de uma semana na ilha depois de acordar com uma das jibóias de Luz sobre seu peito. Em 1959, Jayne Mansfield e seu marido aportaram na ilha, mas foram proibidos de descer pois Jane não queria ficar nua.

Luz passou a viver exclusivamente para a sua Ilha do Sol, o que acabou consumindo suas economias. Com o avanço da idade, o mito começou a conhecer o ocaso. Seus amantes deixaram de ser homens influentes e ricos.

No dia 19 de julho de 1967 os irmãos Alfredo Teixeira Dias e Mozart, o Gaguinho, armaram uma emboscada para Luz del Fuego para dela se vingarem, pois as ações criminosas de Mozart haviam sido apontadas à polícia por Luz. Os dois atraíram Luz ao seu barco e a mataram. Fizeram o mesmo com o caseiro Edgar. O crime só foi desvendado duas semanas depois, a partir do depoimento que um coveiro deu aos jornalistas Mauro Dias, do jornal O Dia e Mauro Costa, do jornal Última Hora. Alfredo foi preso e confessou a participação nas mortes. Os corpos foram resgatados no dia 01 de agosto. Gaguinho conseguiu escapar, mas após uma troca de tiros com a polícia, que acabou matando um Cabo, ele foi preso. A morte de Luz del Fuego poderia não importar à polícia, mas a de um colega militar, em plena ditadura, era algo imperdoável. Os assassinos de Luz foram condenados à pena máxima, que cumpriram no manicômio judiciário do Rio de Janeiro. Com a morte de Luz, o grupo que a seguia se dissipou, fazendo que o naturismo ficasse restrito a algumas famílias que praticavam a nudez social em pontos isolados do país. Seu nome, no entanto, não foi esquecido pois ficou escrito nas estrelas (por Coccinelle).

domingo, 13 de setembro de 2009

Homofobia na política brasileira

Vítimas da intolerância sexual, lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros são caçados diariamente nas comunidades do Rio. Conforme O DIA mostrou em série de reportagens, os homossexuais que moram nas favelas cariocas são alvo do preconceito e da ira de milicianos e traficantes. Muitos acabam assassinados por causa de sua orientação sexual. O aumento dessa violência, que já invadiu até as salas de aula, chamou a atenção da senadora Fátima Cleide (PT-RO). Relatora do projeto de lei que criminaliza a homofobia, ela afirma que o Congresso Nacional é homofóbico. Inconformada com a dificuldade para aprovar a medida, a senadora foi à tribuna mostrar as reportagens e cobrar atitude dos demais parlamentares (por Mahomed Saigg).
O DIA: O que falta para a aprovação do projeto de lei que criminaliza a homofobia no Brasil?
Fátima Cleide
: Relatei o projeto de lei em março de 2008. Mas até agora ele não pôde ser votado sequer na Comissão de Assuntos Sociais por causa de pedidos de vista e votos em separado feitos por alguns senadores. A verdade é que esta proposta tem enfrentado grande rejeição por parte de parlamentares que compõem a Frente Evangélica no Congresso, que são contra sua aprovação.
E o que esses políticos dizem sobre a violência gerada pela homofobia?
O Congresso Nacional é reflexo da sociedade. Como boa parte dos brasileiros tem preconceito, muitos têm receio político de se posicionar na defesa dos direitos humanos, sobretudo de homossexuais. O Congresso é muito homofóbico.
Por quê?
Por causa das próprias atitudes dos parlamentares. Aqui mesmo no Congresso é comum a gente ouvir piadas sobre a orientação sexual de deputados e senadores.
Quais as principais consequências da demora na aprovação desta lei?
Como não existe punição para quem age de maneira homofóbica no Brasil, o preconceito não para de aumentar. E está ficando cada vez mais violento. Uma das principais consequências dessa falta de punição é o isolamento de lésbicas, gays e travestis, que estão ficando cada vez mais limitados a guetos na sociedade.
Como a senhora vê a homofobia nas salas de aula?
Esse problema é gravíssimo porque aumenta a violência nas escolas e a evasão escolar. Hoje em dia, para um homossexual sobreviver na escola, é preciso que tenha muita determinação e força de vontade, porque o preconceito é muito grande. Mas nem sempre isso é suficiente. Se um aluno homossexual é perseguido no colégio, a tendência é que ele não volte nunca mais. Por isso é importante que os professores estejam preparados para lidar com situações como essa.
Muitos homossexuais dizem que não conseguem ingressar no mercado de trabalho. A senhora acredita que esta dificuldade está atrelada à homofobia?
Não há dúvidas de que sim. Se pessoas com alta preparação têm dificuldade para conseguir um emprego, imagina um homossexual que não consegue concluir sequer o Ensino Fundamental! Esse é o caso de muitos gays e lésbicas que abandonam a escola antes de concluir os estudos por causa da perseguição que sofrem.
A senhora acha que a homofobia é mais grave nas favelas e subúrbios?
O preconceito está em todo lugar. Mas nas favelas e periferias, a homofobia é ainda maior. É onde ela se apresenta da forma mais violenta. É também onde ela é mais consentida pela população, que finge não ver o que está acontecendo.
O que fazer para conseguir reverter este quadro?
A homofobia é uma questão cultural, que só será superada com educação. A escola tem um papel fundamental no processo de superação dessa questão. Mas nós já atingimos um patamar tão grande de violência que só a educação não resolve. Por isso insistimos na criminalização da homofobia.

domingo, 6 de setembro de 2009

Poema Falado: Filosofia do Gesto ou Pernambucobucolismo

Lembro-me bem do que escreveu Fernando Pessoa no seu Palavras do Pórtico. Escreveu ele: Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:Navegar é preciso; viver não é preciso*. Quero para mim o espírito [d]esta frase, transformada a forma para a casar como eu sou: Viver não é necessário; o que é necessário é criar. Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso. Só quero torná-la grande, ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo. Só quero torná-la de toda a humanidade; ainda que para isso tenha de a perder como minha. Cada vez mais assim penso. Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir para a evolução da humanidade. É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça. Quero para mim o espírito dessas palavras a fim de transformá-las em minhas e, desta forma, poder dizer: DESCOLAR-SE É PRECISO!

O Poema Falado deste mês discorre sobre o bucólico ato de descolar-se. Reúne quatro poemas: Filosofia do Gesto, de Mel de Carvalho, falado por Sílvio Benevides; Poema para Amsterdam, de Sérgio LDS; Lisboa, de Coimbra de Resende; Vielas de Alfama, belíssimo fado de Maximiano de Sousa e Arthur Ribeiro; e, por fim, Pernambucobucolismo, canção viandante composta por Marisa Monte e Rodrigo Campelo, interpretada pela própria Marisa Monte. Boa Leitura!
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*NOTA: “Navigare necesse; vivere non est necesse”, frase atribuída a Pompeu (106-48 aC.), general romano, dita aos marinheiros que, amedrontados, recusavam viajar durante a guerra.

domingo, 30 de agosto de 2009

De Renato Russo a Santos Dumont

O texto abaixo não é de minha autoria. Quem conhece esse cantinho sabe muito bem que eu, Coccinelle, não publico apenas textos meus, mas, também, textos de outros que admiro e que enxergam o mundo de uma maneira semelhante à minha. A autoria do texto abaixo é da Vange Leonel, cantora, compositora e escritora que admiro muito, não apenas porque compôs NOITE PRETA, o hit de abertura da telenovela global Vamp (que eu adorava e não perdia um só capítulo), mas, sobretudo, por conta dos artigos que publicava na antiga e inesquecível revista SUI GENERIS. Sempre me identifiquei com os escritos dessa mulher inspiradora, seja pelo conteúdo em si, informativo e libertário, seja pela maneira simples e direta que ela utiliza para se comunicar com seus leitores/interlocutores (essa primeira parte do post é de minha autoria).

Renato Russo, Cássia Eller e Cazuza foram raros exemplos de artistas que assumiram, em vida e publicamente, sua homossexualidade. Ney Matogrosso, João Silvério Trevisan, Aguinaldo Silva, o jogador de vôlei Lilico, Leão Lobo, Edson Cordeiro e esta humilde escriba são pessoas com alguma visibilidade na mídia que não escondem sua preferência pelo mesmo sexo.

Há cada vez mais gente assumindo sua homossexualidade para o público, e embora alguns achem tratar-se apenas de sem-vergonhice e exibicionismo, não é: dizemos em alto e bom som que somos gays porque não queremos viver à sombra. Se há homossexuais que não querem fazer alarde de sua condição, há outros, como os citados acima, que não vêem (ou não viram) razão para ocultar suas preferências.

Afinal, heterossexuais podem sair à rua de mãos dadas com seus pares e chegam a festas apresentando-os como “meu namorado” ou “minha mulher”. Ora, por que teríamos que fazer diferente? Só porque gostamos de pessoas do mesmo sexo deveríamos varrer nossos namorados para baixo do tapete?

Não é fácil. Conseguimos maior visibilidade e conquistamos alguma proteção da lei, mas o senso comum ainda acha que, mesmo tendo o direito de existir e respirar, é melhor que fiquemos em nossos cantos, de preferência sob a sombra e abrigados pelo véu da noite, quando os gatos são pardos e as crianças dormem.

Isso me lembra uma declaração que li, meses atrás, de um sujeito empenhado em criar um roteiro turístico sobre Santos Dumont. Imaginando-se paladino do patrimônio nacional, ele disse que, inicialmente, precisaria “limpar” a imagem do aviador e desabafou: “Só no Brasil acontece isso! A coisa mais absurda é ferir a imagem de uma figura de extrema importância mundial com o fato de ele ser ou não homossexual”.

Fiquei pasma. Absurdo é achar que a possibilidade de Santos Dumont ter sido homossexual possa ferir sua imagem. Depois, sujeitos assim ainda vêm dizer que não são preconceituosos e até têm amigos gays – bem trancados no armário, claro!
(por Vange Leonel – Revista da Folha 02/02/2003)
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NOITE PRETA – a música

Música de Vange Leonel e Cilmara Bedaque. Direção do clip: Cilmara Bedaque e Luiz Ferré.




VAMP – a novela

Abertura da telenovela da Rede Globo, escrita por Antônio Calmon e dirigida por Jorge Fernando. Exibida no horário das 19:00h, entre julho de 1991 e fevereiro de 1992, a trama tinha como principais protagonistas a bela e exuberante Cláudia Ohana e o maravilhoso Ney Latorraca. Sucesso retumbante de audiência, especialmente entre crianças e adolescentes.