domingo, 31 de outubro de 2010

Homossexualidade é um comportamento natural

A bióloga Marlene Zuk, que pesquisou a homossexualidade entre os animais, diz que classificar o comportamento de ‘anormal’ é uma precipitação. Presente em diversas espécies na natureza, ele pode ter vantagens evolutivas.

Uma lei que vigorava desde 1861 e que foi derrubada na quinta-feira (2) pela Justiça de Nova Déli, a capital da Índia, previa multas e prisão de até dez anos para os gays e lésbicas. A justificativa expressa no código penal indiano era de que o comportamento homossexual é “um atentado contra a natureza”. Os juízes indianos consideraram que a proibição era uma violação dos “direitos fundamentais” e, após 148 anos, alteraram a legislação.

Esse tipo de argumento – de que o sexo com indivíduos do mesmo gênero não é natural –, muito usado no século 19, é recorrente até os dias de hoje e permeia o debate do tema em vários países. As observações científicas, no entanto, demonstram que o argumento não tem base, já que são vários os exemplos de animais que mantêm relações sexuais e até mesmo de parceria com indivíduos do mesmo gênero.

Os biólogos Nathan Bailey e Marlene Zuk, da Universidade da Califórnia em Riverside, publicaram no mês passado um estudo que é uma revisão de várias outras pesquisas sobre o tema. O trabalho, publicado no periódico Trends in Ecology and Evolution (Tendências em Ecologias e Evolução), reforça que o sexo homossexual é muito comum no mundo animal e é motivado por diferentes razões, como a falta de um parceiro do outro sexo, a necessidade de formar alianças, praticar e reforçar a hierarquia, por engano e até para criar um filhote.

Nesta entrevista a ÉPOCA, a professora Marlene Zuk fala sobre a pesquisa e diz que, na discussão sobre a homossexualidade, a sociedade foi apressada demais ao classificar o sexo entre pessoas do mesmo gênero de “anormal”.

ÉPOCA – Qual foi a conclusão do estudo sobre sexo entre animais do mesmo gênero?
Marlene Zuk – Percebemos que o sexo homossexual entre animais é extremamente comum e extremamente variável; muitos animais têm interações desse tipo, e elas vão desde um casal duradouro de albatrozes fêmeas até o rápido cortejo entre dois machos de mosquitos de frutas.

ÉPOCA – O sexo homossexual entre animais tem algum papel na evolução?
Marlene – Sim, pois esse comportamento pode permitir aos animais passar seus genes para frente mesmo que não estejam participando de um acasalamento heterossexual.

ÉPOCA – Você pode dar alguns exemplos?
Marlene – Há alguns besouros que forçam relações com outros machos. Há evidências de que o esperma depositado pode acabar sendo transferido para as fêmeas quando esse macho for acasalar, passando para frente assim os genes do primeiro macho. Um outro caso é o de algumas populações de albatrozes que observamos no Havaí nas quais há mais fêmeas do que machos. Nessas circunstâncias, duas delas podem se juntar e cooperar na criação de um filhote e, algumas vezes, têm mais sucesso do que os casais heterossexuais. Isso pode influenciar o funcionamento da população e alterar suas características, passando o gene da albatroz fêmea homossexual para frente.

ÉPOCA – E há alguma vantagem evolucionária de se relacionar apenas com animais do mesmo sexo?
Marlene – Há custos e benefícios para todos os comportamentos, incluindo aqueles entre seres do mesmo sexo. As pessoas talvez tenham sido muito precipitadas ao classificar o comportamento homossexual como aberração ou anormal. Ele ocorre sob algumas circunstâncias, mas não em outras, mas esse é o padrão de muitos outros comportamentos.

ÉPOCA – Isso vale tanto para o comportamento dos humanos quanto dos animais?
Marlene – Sim, há uma longa história de chamar a homossexualidade humana de anormal e até de caracterizá-la como um distúrbio psiquiátrico. Mesmo no caso dos animais, as pessoas tentam achar uma “desculpa” para o comportamento, dizendo que é resultado do cativeiro, ou que representa algum tipo de patologia. Mas cada vez mais estamos descobrindo que as experiências homossexuais são parte da vida animal.

ÉPOCA – O que motiva o sexo homossexual entre os animais?
Marlene – Isso ocorre por razões muito diferentes em animais diferentes. Em moscas de fruta, por exemplo, os machos cortejam outros machos porque um gene que os faz distinguir machos de fêmeas está alterado. Mas nos bonobos o sexo é usado socialmente, como uma forma de resolver tensões entre alguns indivíduos.

ÉPOCA – É possível comparar o comportamento homossexual entre os humanos e os animais?
Marlene – Sim e não. Sim porque, como outros animais, os humanos têm várias formas de passar seus genes para frente, tanto diretamente – tendo filhos – quanto indiretamente, fazendo alguma coisa para favorecer seu sobrinhos ou netos, por exemplo. Mas, por outro lado, não é possível comparar porque os outros animais não apresentam parcerias entre dois machos ou duas fêmeas para a vida toda, a não ser que tenham acasalado com o sexo oposto, como no caso do albatroz.

ÉPOCA – Como você vê a ideia de que ser gay é genético? Do ponto de vista da ciência, isso é possível?
Marlene – A maior parte dos biólogos acredita que todos os comportamentos, seja um relativamente simples como o jeito que a pessoa anda, até os extremamente complexos, como a orientação sexual, têm origem na combinação dos genes e do ambiente. Assim, a procura pelo “gene gay” é simplificada demais, assim como a ideia de que vamos encontrar uma fonte social para isso (Fonte: Revista Época).

sábado, 23 de outubro de 2010

Aborto não é tema para ser tratado com leviandade

Eu, Coccinelle, resolvi postar o texto abaixo por acreditar que o aborto é uma questão de saúde pública no Brasil. É um assunto sério de grande interesse da sociedade brasileira. Portanto, não pode ser tratado de forma levianamente eleitoreira, voltada, exclusivamente, para arrebanhar os votos das mentes retrógradas desse país que deturpam as palavras de amor deixadas por Jesus Cristo para espalhar o ódio e a intolerância no sei da sociedade brasileira. Penso que o dirigente de um país democrático deve pensar no bem-estar do seu povo como um todo e não em privilegiar uns poucos que nada sabem sobre respeito. Leiam o texto e vejam se não tenho razão.

Aborto ilegal é 300 vezes mais perigoso para a mulher que o legal

Como fruto da Conferência Mundial de Direitos Humanos, celebrada em Viena em 1993, foi reconhecido que os direitos das mulheres são também direitos humanos e que os países deveriam garantir uma atenção adequada à sua saúde, assim como ao planejamento familiar.

De maneira complementar, desde 1994, após a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, realizada no Cairo, os membros da ONU (Organização das Nações Unidas) reconhecem como direitos humanos aqueles relacionados à reprodução e à sexualidade.

Em 1995, durante a IV Conferência Mundial das Nações Unidas sobre a Mulher, o Desenvolvimento e a Paz, realizada em Pequim, foi firmada uma Plataforma para a Ação, onde os Estados afirmam que “a capacidade de as mulheres controlarem sua própria fecundidade constitui uma base fundamental para desfrutar outros direitos”. No texto final, pede-se aos países que atentem para “a possibilidade de re visar as legislações que prevêem medidas punitivas contra as mulheres que fizeram abortos ilegais”.

Além disso, “levando em consideração que o aborto inseguro é uma grave ameaça à vida e à saúde da mulher”, propôs-se, como objetivo estratégico, “promover pesquisas dedicadas a compreender e encarar com mais eficácia as condições que determinam o aborto induzido e suas conseqüências, incluindo efeitos futuros na fecundidade, saúde reprodutiva e mental e na prática contraceptiva”.

Mortalidade da mulher

Segundo cálculos da OMS (Organização Mundial de Saúde), a taxa de mortalidade devida a abortos induzidos varia de 0,2 a 1,2 mortes a cada 100 mil abortos nos países onde a prática é legalizada; naqueles onde não é, o número sobe para 330 mortes a cada 100 mil abortos. Cerca de 13% das aproximadamente 600 mil mortes por ano de mulheres relacionadas à gestação e ao parto ocorrem em decorrência de abortos inseguros, ou seja, sem recursos mínimos de higiene e assistência capacitada.

Paralelamente a essas discussões foi criada, em 1998, a Corte Penal Internacional, com o objetivo de julgar indivíduos acusados de violar os acordos internacionais. Em seu estatuto está a questão da gravidez forçada, que é considerada um crime de lesa humanidade e um crime de guerra junto com a violência, a escravidão sexual, a prostituição forçada, a esterilização forçada e outros tipos de abusos sexuais tão graves quanto.

Em 16 de setembro de 2010, a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet, foi nomeada para coordenar a recém-criada ONU Mulher, uma espécie de "superagência" das Nações Unidas que reunirá as quatro já existentes relacionadas ao tema (o Fundo para o Desenvolvimento da Mulher - Unifem, a Divisão da ONU para o Avanço da Mulher, o Instituto Internacional de Pesquisas e Capacitação para a Promoção da Mulher e o Escritório Especial em Assuntos de Gênero).

A nomeação foi recebida positivamente por grupos pró-aborto e vista como uma possibilidade para avançar na discussão sobre sua descriminalização. Ainda que o Chile tenha uma das legislações mais proibitivas do mundo, não aceitando nenhuma exceção às interrupções voluntárias de gestações, quando presidente Bachelet apoiava a chamada “pílula do dia seguinte”, que previne a gravidez até 72 horas após o sexo sem proteção (por Maíra Kubík Mano para o sítio Opera Mundi).

domingo, 17 de outubro de 2010

Cidadania LGBT e as Eleições 2010

Já na primeira semana do segundo turno das eleições presidenciais de 2010, dois Projetos de Lei - da competência do Legislativo Federal – surgiram no debate acerca das candidaturas ao mais alto cargo do Executivo. Nesta confusão entre competências das esferas governamentais, trouxe-se para a arena eleitoral a discussão da cidadania da população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais (LGBT), como se a questão dos direitos humanos de determinados setores da sociedade fosse algo que pudesse ser usado para desmerecer uma ou outra candidatura à Presidência da República.

À luz das discussões e declarações feitas aos meios de comunicação na semana passada sobre os Projetos de Lei em questão: o Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 122/2006 e o Projeto de Lei nº 4914/2009; sinto-me obrigado a fazer umas considerações e a reproduzir na íntegra o texto de ambas as proposições, para que – em vez distorções e afirmações inverídicas a seu respeito – os(as) leitores(as) possam conhecer, avaliar e chegar às suas próprias opiniões sobre os mesmos. Recorrendo ao filósofo grego Aristóteles, quando disse “O ignorante afirma, o sábio duvida, o sensato reflete”, vamos à reflexão:

O PLC 122/2006 objetiva amparar setores da população que ainda não contam com legislação específica que os garanta a proteção contra a discriminação, criando um paralelo com outras leis já regulamentadas que dispõem sobre crimes de discriminação, como é o caso do racismo. Ademais, o PLC 122/2006 não se restringe somente à proteção da população LGBT, sendo muito mais abrangente do que isso.

Projeto de Lei da Câmara nº 122, de 2006:

(Substitutivo aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais do Senado Federal em 10/11/2009)

Art. 1º A ementa da Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Define os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero.” (NR)

Art. 2º A Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 1º Serão punidos, na forma desta Lei, os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero.” (NR)

“Art. 8º Impedir o acesso ou recusar atendimento em restaurantes, bares ou locais semelhantes abertos ao público.

Pena: reclusão de um a três anos.
Parágrafo único: Incide nas mesmas penas aquele que impedir ou restringir a expressão e a manifestação de afetividade em locais públicos ou privados abertos ao público de pessoas com as características previstas no art. 1º desta Lei, sendo estas expressões e manifestações permitidas às demais pessoas.” (NR)

“Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero.

Pena: reclusão de um a três anos e multa.” (NR)

Art. 3º O § 3º do art. 140 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passa a vigorar com a seguinte redação:

“§ 3º Se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem, condição de pessoa idosa ou com deficiência, gênero, sexo, orientação sexual ou identidade de gênero: ...........................................................................” (NR)

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

No caso especifico da população LGBT, determinados setores no Congresso Nacional têm argumentado desde a Constituinte que basta a disposição generalizada constante do Art. 3º da Constituição Federal, de que não haverá “preconceitos de ... sexo, ... e quaisquer outras formas de discriminação.”

Ora, se fosse assim, não ocorreriam em média 200 assassinatos de pessoas LGBT por ano no Brasil; a impunidade dos autores destes crimes não seria corriqueira; não haveria estudos científicos produzidos por organizações de renome, como a Unesco, e até pelo próprio Ministério da Educação, comprovando inequivocamente a existência de níveis elevados de práticas e atitudes discriminatórias contra pessoas LGBT nas escolas; não haveria estudos da Academia confirmando esta mesma discriminação na sociedade brasileira como um todo. O Governo Federal não teria implantado o Programa Brasil Sem Homofobia, e não estaria implementando o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT, se não existissem discriminação e violência contra esta população.

Parte do propósito do PLC 122/2006 é contribuir para reverter este quadro vergonhoso de desrespeito aos direitos humanos básicos da população LGBT no Brasil, como descreveu o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello:

“São 18 milhões de cidadãos considerados de segunda categoria: pagam impostos, votam, sujeitam-se a normas legais, mas, ainda assim, são vítimas de preconceitos, discriminações, insultos e chacotas” [...] e que as vítimas dos homicídios [...] “foram trucidadas apenas por serem homossexuais”.

O PLC 122/2006 tem sido apelido por determinados setores de “mordaça gay”. Afirmamos que a liberdade de expressão é universal, um direito de todos, inclusive a liberdade de expressão de crença religiosa, conforme garantida constitucionalmente. O projeto não veda que dentro do estabelecimento religioso se manifestem as crenças e se mantenham as posições religiosas, nem existe a possibilidade de padres ou outras autoridades religiosas serem presos por estes motivos e muito menos a Bíblia ou outros livros sagrados serem "modificados". Mas a liberdade de expressão, seja de quem for (das religiões, das pessoas LGBT, de todo mundo), também há de respeitar o próximo, sem discriminá-lo. Isto vale para todos, e não se constitui em uma espécie de penalidade às religiões. É apenas a aplicação do preceito constitucional da universalidade da não discriminação e da não violência.

Ademais, o PLC 122/2006 foi motivo de várias audiências públicas e já sofreu alterações no Senado, visando atender aos anseios acima expostos. Ao terminar sua tramitação no Senado terá que voltar para a Câmara dos Deputados em razão das modificações que sofreu e ainda poderá vir a sofrer. Sempre estivemos abertos ao diálogo com todas as partes interessadas para que a proposição final tenha a melhor redação possível, ao mesmo em que garanta a não discriminação, inclusive das pessoas LGBT.

O outro projeto de lei que teve seu propósito distorcido no debate das eleições presidenciais diz respeito à união estável entre pessoas do mesmo sexo. Reproduzo aqui o texto desta proposição:

Projeto de Lei nº 4914/2009 de 2009:

Art. 1º - Esta lei acrescenta disposições à Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, relativas à união estável de pessoas do mesmo sexo.

Art. 2º - Acrescenta o seguinte art. 1.727 A, à Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002, Código Civil.

“Art. nº 1.727 A - São aplicáveis os artigos anteriores do presente Título, com exceção do artigo 1.726, às relações entre pessoas do mesmo sexo, garantidos os direitos e deveres decorrentes.”

Art. 3º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Como se pode ver, o P/L nº 4914/2009 propõe tão somente o alterar o Código Civil para que reconheça a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Em nenhum momento propõe o casamento, pelo contrário: faz exceção a esta possibilidade.

Cabe indagar, por que tanta polêmica acerca do “casamento gay nas igrejas”. Onde será que está escrito isso no projeto de lei acima?

O P/L nº 4914/2009 visa apenas garantir os direitos civis de pessoas do mesmo sexo que convivem em união estável. Isto porque estudos mostram que, comparando um casal heterossexual com um casal homossexual, este último não tem acesso a pelo menos 78 direitos garantidos ao casal heterossexual, entre eles: não têm reconhecida a união estável; não têm direito à herança; não têm direito à sucessão; não podem ser curadores do parceiro declarado judicialmente incapaz. Em alguns casos essa falta de amparo aos casais do mesmo sexo chega a ser cruel, como no caso da morte de um(a) parceiro(a), onde o(a) parceiro(a) sobrevivente – às vezes depois de muitos anos de convivência – além de perder o(a) parceiro(a), fica sem nenhum bem e nem sem onde morar, porque a família do(a) falecido(a) exerce o direito sobre a propriedade deste(a), enquanto o(a) sobrevivente é desamparado(a) pela lei na forma como está.

Aqui tem-se um caso patente do descumprimento das disposições Constitucionais da igualdade, da não discriminação e da dignidade humano, que o P/L nº 4914/2009 visa corrigir.

Há de se lembrar que tanto o PLC nº 122/2006 como o P/L 4914/2009 tratam de questões de direitos civis. São proposições legislativas fundamentadas na lei maior da nação brasileira, a Constituição Federal.

Ainda, o Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e os princípios, direitos e garantias fundamentais de nossa Constituição se baseiam nela. A Declaração é “Universal” porque os direitos humanos são indivisíveis. Ou seja, aplicam-se igualmente a todos os seres humanos, independente de sua nacionalidade, cor, etnia, convicção religiosa, e independente de serem heterossexuais, bissexuais, homossexuais, ou de qualquer outra condição

Outro princípio fundamental que deve ser preservado acima de tudo neste debate é o princípio da laicidade do Estado. Desde a Proclamação da República, em 1889, o Estado brasileiro é laico. Isso quer dizer que no Estado laico não há nenhuma religião oficial, e há separação entre o governo e as religiões. Assim sendo, os cultos, as crenças e outras manifestações religiosas são respeitadas, dentro de suas esferas independentes, da mesma forma que o Estado tem sua independência das religiões.

Creio piamente que os direitos humanos não se barganham, não se negociam, simplesmente se respeitam, e que devemos escolher nossa candidatura pelas propostas que tem pelo país, pela biografia, pela capacidade de governar, e pela capacidade de fazer valer a Constituição Federal, indiscriminadamente.

Como disse Ulisses Tavares precisamos olhar de novo: não existem brancos, não existem amarelos, não existem negros: somos todos arco-íris (por Toni Reis, Presidente da ABGLT– Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais).

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Em favor da política e da nação brasileira

Por concordar plenamente com as palavras do meu amigo Silvio, eu, Coccinelle, decidi reproduzir nesse cantinho o seu desabafo indignado. As forças políticas retrógradas desse país estão a tentar desviar a atenção da população do debate político sobre temas e temáticas que realmente nos interessam para centrar seus ataques em especulações e acusações infundadas. Não é assim que se ganha uma eleição. O povo brasileiro não merece tanta baixaria. Mas essa forças oriundas das catacumbas agem dessa forma porque são vazias e continuam a pensar que o Brasil não mudou. Sim, mudamos! Leiam o texto, opinem e divulguem.

Quando falo de política com os meus educandos e educandas tento fazê-los perceber o quão importante ela é para nossas vidas. Desde as atividades mais simples e corriqueiras, como atravessar uma rua, por exemplo, até decisões mais complexas, como dar ou não apoio ao governo do Irã perante a comunidade internacional, a política se faz presente, organizando e orientando a vida social. É por meio dela que nos mobilizamos para defender ou reivindicar direitos, para mudar ou preservar nossa realidade, nossa história. É por meio da política que os direitos por nós reivindicados e pelos quais lutamos são transformados em leis. Esta é a principal função dos membros do Poder Legislativo, os senadores, deputados federais e estaduais e vereadores. É por meio da política, também, que as leis se transformam em políticas públicas, aquelas que podemos perceber no nosso dia-a-dia, seja na escola, no ambiente de trabalho, no hospital, nos supermercados e feiras livres, nas tarifas dos transportes públicos, ou, ainda, no salário nosso de cada mês. Esta é uma das inúmeras atribuições do Poder Executivo representado, no caso brasileiro, pelo Presidente da República, governadores e prefeitos. É sobre o papel e a importância da política em nossas vidas que falo aos estudantes nas minhas aulas de Comunicação e Política. Entretanto, a despeito dessa ênfase, as conversas em sala de aula sobre o tema, inevitavelmente, trazem a tona o seu lado podre. Refiro-me a uma espécie de labor político completamente vazio de idéias e ideais, porém, repleto de torpeza. Não critico meus alunos por enfatizarem o lado negativo da atividade política, afinal, temos razões de sobra para assim procedermos, especialmente nesse momento eleitoral.

Nas semanas que antecederam as eleições de 03 de outubro recebi por e-mail diversas mensagens sobre a candidata do PT, Dilma Rousseff. Em todas elas, impropérios descabidos. Algumas eu respondia, outras, no entanto, eu ignorava. Contudo, as mensagens não pararam de chegar e se intensificaram após o resultado da apuração que confirmou o segundo turno das eleições. Uma destas mensagens, atribuída ao ator Carlos Vereza, depois de comparar o PT ao partido nazista alemão e o processo eleitoral de 2010 à Kristallnacht, ou seja, a Noite dos Cristais, que marcou em 1938 o início da perseguição dos judeus pelos nazistas, terminava da seguinte maneira: “Não podemos nem pensar em colocar como Presidente do Brasil uma mulher terrorista, que passou a vida assaltando bancos, matando pessoas inocentes, arrombando casas, roubando e matando. Só uma pessoa internada num manicômio seria capaz de votar numa bandida para presidente de um País”. Confesso que não saberia definir o que é mais escabroso. Comparar a democracia brasileira atual ao nazismo ou defender a idéia de que os opositores do regime militar que ingressaram na luta armada eram bandidos.

Eu, sinceramente, não acredito que um homem como o Carlos Vereza, talentoso, inteligente e que, como poucos, sabe muito bem como é fazer teatro/arte sob a vigilância cerrada de uma ditadura militar tenha escrito um texto tão pífio. Uma enorme falta de respeito a todos aqueles militantes políticos de esquerda que pegaram em armas para livrar o país do autoritarismo militar. Achar que a luta armada foi um erro de estratégia e um erro político, tudo bem, eu aceito e, até certo ponto, concordo. Mas comparar os militantes da luta armada com bandidos é um absurdo e, no mínimo, um desrespeito para com aqueles que, literalmente, deram sangue por esse país para que hoje o direito da livre expressão das idéias possa ser exercido por qualquer pessoa sem o temor da tortura ou qualquer outro tipo de represália. Criticar sim! Ser duro sim, mas sem desrespeitar a nossa história e, principalmente, a memória dos cidadãos de bem!

Outra mensagem, cuja autoria não é atribuída a ninguém, isto é, trata-se de uma mensagem anônima (um ato típico dos covardes), iniciava da seguinte maneira: “Para contribuir com a política de meu país e mostrar que Dilma já deu as suas contribuições para o avanço do Brasil, peço aos meus amigos que me enviem, se for possível: fotos dela lutando pela democracia e não pelo comunismo [...] uma foto da Dilma, exemplo: nas Diretas Já; uma foto da Dilma em uma passeata pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita [...] uma foto dela no Impeachment do Collor [...] uma foto ou vídeo de algum trabalho social de que ela já tenha participado; uma foto ou vídeo em que ela se mostre autenticamente simpática; uma foto com a família”. Mesmo não tendo sido eleitor da Dilma, não posso deixar de me indignar com esse tipo de “campanha”(?!). Esses ataques são fruto de gente rancorosa ou, no mínimo, desinformada. Reflitam comigo.

Dilma Rousseff foi nos anos 1960 uma militante de esquerda que aderiu à luta armada contra a ditadura militar. Naqueles tempos lutar contra a ditadura significava lutar a favor da democracia e da liberdade de expressão. Ademais, quem foi que disse que o comunismo é incompatível com a democracia? Sabemos muito bem que o comunismo é, sim, compatível com regimes democráticos, basta lembrarmos a experiência da antiga Tchecoslováquia em 1968, que, infelizmente, foi sufocada pela então toda poderosa União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Lamentavelmente, as experiências comunistas/socialistas que o mundo, de fato, conheceu e vivenciou não foram democracias, mas, sim, ditaduras comunistas, como ditaduras foram aquelas que ocorreram em alguns países capitalistas europeus como a Alemanha de Hitler, a Itália de Mussolini, a Espanha de Franco, Portugal de Salazar e em todos os países da América Latina, inclusive no nosso Brasil, que nunca foi comunista, mas nem por isso esteve imune às ditaduras do Estado Novo de Getúlio Vargas e do “novo Estado” instituído com o Golpe Militar de 1964. Portanto, ditaduras, ou seja, ausência de democracia, não são exclusividade de regimes comunistas.

Vamos à outra questão. Como já disse, penso que a luta armada no Brasil foi um equívoco das organizações de esquerda que optaram por essa via. Entretanto, respeito muito aqueles que dela fizeram parte, pois se houve alguém que, literalmente, deu o sangue por esse país, foram os homens e mulheres que pegaram em armas para defender a democracia brasileira e a liberdade política e de expressão da sua população. Quase todos/as (senão todos) foram torturados/as, pagaram com suas vidas, desapareceram e outros carregam até hoje os traumas dessa terrível experiência, a experiência da tortura física e psicológica. Se não há foto ou vídeo da Dilma nos porões da ditadura isso ocorreu porque os próprios torturadores não permitiram que jornalistas cobrissem esse fato, porque no Brasil da ditadura a imprensa estava amordaçada. Do mesmo modo, se não há foto ou vídeo da Dilma em passeatas pela Anistia ampla geral e irrestrita é porque, tendo sido presa em 1970 juntamente com outras tantas mulheres ousadas e corajosas, que se atreveram a desafiar o regime militar, ela, muito provavelmente, se encontrava sob vigilância dos carrascos da ditadura. Se não há fotos dela, como minhas também não há, no Impeachment de Collor ou na Constituinte, talvez isso tenha ocorrido porque ela, assim como eu, talvez estivesse envolvida com outros afazeres. Nos regimes democráticos não somos obrigados a participar de passeatas ou qualquer outro tipo de manifestação pública. Somos livres para exercermos nossa cidadania da maneira que julgamos ser a melhor. Se, do mesmo modo, não há fotos dela com a família, talvez seja pelo fato da candidata Dilma ser uma mulher discreta. Sua vida política é pública, mas sua vida familiar e pessoal não. Nas democracias temos o direito à privacidade. Quanto a ser simpática, não temos nenhuma obrigação de sê-lo, nem mesmo nos regimes democráticos. Depois, simpatia é uma questão de ponto de vista, portanto, algo bastante subjetivo para ser avaliado objetivamente.

Os impropérios continuam sendo difundidos pela internet. Alguns até mesmo em sites oficiais de deputados federais outrora liberais e, hoje, democratas. Um destes, desta vez foi atribuído à jornalista Marília Gabriela. Ela teria confessado o seu medo da candidata Dilma, comparando-a a pais autoritários e diretores escolares carrascos. Tudo mentira, segundo a própria Marília Gabriela. “Não tem nada a ver comigo, não escrevo daquela forma, não tem meu estilo. Qualquer pessoa criteriosa vai perceber que uma jornalista como eu não iria fazer isso, assumir uma gracinha dessas. Eu vivo de entrevistas. Gostaria de entrevistar todos os candidatos. Não cometeria essa estupidez”, afirmou a jornalista, que declarou, também, buscar assistência jurídica com os seus advogados a fim de encontrar um meio para punir os responsáveis por esse ato que pode ser classificado de falsidade ideológica, um crime, de acordo com nossas leis brasileiras.

Tudo indica que o vale tudo foi deflagrado. Mentiras, enganções, leviandades e dissimulações parecem reger o tom da dança eleitoral. Quero deixar claro que não sou nem contra nem a favor da Dilma Rousseff. Sou a favor da política, pois, como já disse, ela é fundamental para a vida em sociedade. E foi por acreditar na política que eu decidi escrever esse texto. Não apenas para externar minha indignação, mas, sobretudo, para fazer valer a idéia de que política é coisa séria e digna, destinada aos homens e mulheres de bem. Sendo assim, ela não pode ser confundida com esse lodo fétido, cujo jorrar favorece tão somente aqueles de alma e coração espúrios e em nada contribui para o debate político, para o fortalecimento da nossa democracia e da nossa cidadania e, muito menos, para o desenvolvimento do Brasil como uma nação “gigante pela própria natureza” (por Sílvio Benevides).

domingo, 3 de outubro de 2010

Poema Falado: Coming

A filósofa existencialista Simone de Beauvoir escreveu em sua obra de referência, O Segundo Sexo, que não se nasce mulher. Torna-se. O mesmo se pode dizer a respeito do homem. Não se nasce homem. Torna-se. Ser mulher ou homem não é um dado natural, uma condição biológica, mas, sim, um papel social que se aprende e apreende ao longo de nossa existência, sobretudo, nos primeiros anos de nossas vidas. O certo mesmo é que seres humanos nascem machos ou fêmeas, como qualquer mamífero, réptil, ave, anfíbio, peixe, inseto ou molusco. Entretanto, a maneira como esses seres humanos machos ou fêmeas se comportam em sociedade resulta de um processo de aprendizagem, que a sociologia chama de socialização. Internalizamos as funções atribuídas para cada sexo de tal modo que passamos a crer que tais funções são determinadas pela natureza e não pela cultura. Daí as ciências sociais fazerem uma distinção entre sexo, uma condição biológica (macho/fêmea) e gênero, um papel social (homem/mulher). Dito desta forma, tudo seria muito simples. Todavia, a vida social não é tão simples assim. Alguns seres humanos, os mais audaciosos, se recusam a internalizar esquemas prontos e acabados do tipo ou isto ou aquilo e ponto final. Não. Por se sentirem livres, transitam entre os gêneros com tamanha desenvoltura que costumam fundir e confundir a cabeça de muita gente. Por isso são desqualificados e, na maioria das vezes, vítimas de toda sorte de perseguição, humilhação e escárnio por “não saberem qual é o seu lugar”. Entretanto, há quem pense que estas pessoas representam o que está porvir. De fato, aqueles que ousam é que são os verdadeiros agentes das mudanças. Os covardes preferem a inércia. Para homenagear a coragem e audácia destes seres humanos ousados, o Poema Falado deste mês traz um texto/música escrito por David Motion, Sally Potter e Jimmy Sommerville, para o filme “Orlando”, dirigido pela Sally Potter e baseado na obra homônima da Virgínia Woolf. A versão em português ficou por conta de Coccinelle, que o traduziu assim: “Estou a chegar! A chegar além! Além de toda e qualquer divisão! Nesse momento de união / Sinto uma enorme euforia / Por estar aqui, agora / Livre, enfim / Sim, livre estou / De tudo o que já passou / E do porvir que acena para mim / Estou a chegar! Estou a chegar! Aqui estou! Nem mulher, nem homem / Somos todos tão somente / Uma única humana face / Somos todos simplesmente / Uma única face humana / Estou na Terra / E também fora dela / Estou a nascer e a morrer”. Veja o vídeo e tenha uma boa audio-leitura (por Sílvio Benevides).