domingo, 30 de agosto de 2009

De Renato Russo a Santos Dumont

O texto abaixo não é de minha autoria. Quem conhece esse cantinho sabe muito bem que eu, Coccinelle, não publico apenas textos meus, mas, também, textos de outros que admiro e que enxergam o mundo de uma maneira semelhante à minha. A autoria do texto abaixo é da Vange Leonel, cantora, compositora e escritora que admiro muito, não apenas porque compôs NOITE PRETA, o hit de abertura da telenovela global Vamp (que eu adorava e não perdia um só capítulo), mas, sobretudo, por conta dos artigos que publicava na antiga e inesquecível revista SUI GENERIS. Sempre me identifiquei com os escritos dessa mulher inspiradora, seja pelo conteúdo em si, informativo e libertário, seja pela maneira simples e direta que ela utiliza para se comunicar com seus leitores/interlocutores (essa primeira parte do post é de minha autoria).

Renato Russo, Cássia Eller e Cazuza foram raros exemplos de artistas que assumiram, em vida e publicamente, sua homossexualidade. Ney Matogrosso, João Silvério Trevisan, Aguinaldo Silva, o jogador de vôlei Lilico, Leão Lobo, Edson Cordeiro e esta humilde escriba são pessoas com alguma visibilidade na mídia que não escondem sua preferência pelo mesmo sexo.

Há cada vez mais gente assumindo sua homossexualidade para o público, e embora alguns achem tratar-se apenas de sem-vergonhice e exibicionismo, não é: dizemos em alto e bom som que somos gays porque não queremos viver à sombra. Se há homossexuais que não querem fazer alarde de sua condição, há outros, como os citados acima, que não vêem (ou não viram) razão para ocultar suas preferências.

Afinal, heterossexuais podem sair à rua de mãos dadas com seus pares e chegam a festas apresentando-os como “meu namorado” ou “minha mulher”. Ora, por que teríamos que fazer diferente? Só porque gostamos de pessoas do mesmo sexo deveríamos varrer nossos namorados para baixo do tapete?

Não é fácil. Conseguimos maior visibilidade e conquistamos alguma proteção da lei, mas o senso comum ainda acha que, mesmo tendo o direito de existir e respirar, é melhor que fiquemos em nossos cantos, de preferência sob a sombra e abrigados pelo véu da noite, quando os gatos são pardos e as crianças dormem.

Isso me lembra uma declaração que li, meses atrás, de um sujeito empenhado em criar um roteiro turístico sobre Santos Dumont. Imaginando-se paladino do patrimônio nacional, ele disse que, inicialmente, precisaria “limpar” a imagem do aviador e desabafou: “Só no Brasil acontece isso! A coisa mais absurda é ferir a imagem de uma figura de extrema importância mundial com o fato de ele ser ou não homossexual”.

Fiquei pasma. Absurdo é achar que a possibilidade de Santos Dumont ter sido homossexual possa ferir sua imagem. Depois, sujeitos assim ainda vêm dizer que não são preconceituosos e até têm amigos gays – bem trancados no armário, claro!
(por Vange Leonel – Revista da Folha 02/02/2003)
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NOITE PRETA – a música

Música de Vange Leonel e Cilmara Bedaque. Direção do clip: Cilmara Bedaque e Luiz Ferré.




VAMP – a novela

Abertura da telenovela da Rede Globo, escrita por Antônio Calmon e dirigida por Jorge Fernando. Exibida no horário das 19:00h, entre julho de 1991 e fevereiro de 1992, a trama tinha como principais protagonistas a bela e exuberante Cláudia Ohana e o maravilhoso Ney Latorraca. Sucesso retumbante de audiência, especialmente entre crianças e adolescentes.


domingo, 23 de agosto de 2009

Pour Coccinelle

Comment vas-tu? J’espére que tout va bien avec tu et ta famille. Je suis trés heureux. Pour cet raison, je écris pour vous cette letre. Pour diviser moi félicité avec vous, qui êtes moi meilleur ami.

Tu souviens de le voyage que j’ai fait a Caicolândia? Cette voyage est allé la meilleur de ma vie, parce que là j’ai recontré la lumière que aujourd’hui illumine mes jours et mes nuits aussi. Cette lumière s’apelle Anatércia et elle est plus radieux que le soleil ou la pleine lune.

Nous nous recontrions en une matin de samedi. Anatércia avait passé devant ma fenêtre, quand je la voyais pour la première fois. Elle a ressemblé une brume a glisser sur la terre recouvrait de poussière. Elle est allé pour la marche. Je la suivis. Elle a acheté banane, haricot, farine, riz, courge et viande de porc, beacoup viande. Elle n’a pu pas porter tout chose que avait acheté parce que ils sont été lourd. Je me offris pour la servir. Elle a souriri pour moi tendrement et je suis presque mort.

Quand nous avions arrivé a sa maison, elle a me inventé pour entrer. J’ai accepté le invitation. En sa modeste maison, mais très chaleureux, elle a me offert eau de coco. Cett’eau a été la meilleur que j’ai déjà bu. Après une long conversation, nous avons percevu que le temp a passé. Mais déjà a été très tard. Nous étions amoureux beaucoup. Nous n’avons voulu pas fuir de notre passion. Pour cet raison, nous avons continué a boire eau de coco, que est bom pour notre santé. À bien-tôt. Ariovaldo
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O amor é como como água de côco. Não bastasse ser algo deliciosamente delicioso, faz um bem danado à saúde. Só me resta, então, dizer bebamos, pois! Bebamos para embriagarmo-nos de amor até o amanhecer e, assim, gozarmos todas as delícias da voluptuosidade (Coccinelle).

domingo, 16 de agosto de 2009

Todo mundo é meio Leila Diniz

Viver e não ter a vergonha de ser feliz”, ou melhor, viver e não ter a vergonha de ser, simplesmente. Esses versos da música do Gonzaguinha parecem ser bastante apropriados para definir uma das personalidades mais fascinantes do Brasil, Leila Diniz. A sua revolução não foi aprisionada por amarras teóricas ou conceituais, foi, isto sim, vivida intensamente, fazendo dela uma mulher libertária. Talvez por isso seu comportamento e suas idéias escandalizassem tanto a conservadora sociedade brasileira dos anos 60.

Leila Roque Diniz nasceu no dia 25 de março de 1945, em Niterói, estado do Rio de Janeiro. Ainda adolescente saiu de casa e passou a viver com o cineasta Domingos de Oliveira. Chegou a trabalhar como professora primária até o início de sua carreira artística, na peça O PREÇO DE UM HOMEM, a convite de Cacilda Becker (1964). No ano seguinte, estrearia no cinema, em O MUNDO ALEGRE DE HELÔ. Nesse período, separou-se de Domingos de Oliveira e passou a viver sozinha.

Em 1966, ganhou notoriedade com TODAS AS MULHERES DO MUNDO, filme autobiográfico de Domingos de Oliveira sobre o casamento dos dois. Junto ao ator Paulo José, apareceu nua e esplendidamente bonita, vivendo a história de um amor que se transformava em amizade. Sua espontaneidade e brilho ao representar praticamente a si mesma transformaram-na em modelo de mulher livre para boa parcela das classes média e alta. O filme conquistou o público e recebeu sete prêmios no Festival de Brasília. A partir de então Leila passou a trabalhar intensamente. Em 1968 filmou EDU, CORAÇÃO DE OURO, FOME DE AMOR, O HOMEM NU e A MADONA DE CEDRO. Além de filmes, atuou em várias telenovelas, entre as quais O SHEIK DE AGADIR e O ALIENISTA. Em 1969, estrelou TEM BANANA NA BANDA, espetáculo de teatro que se notabilizou por ter revitalizado o gênero de revista.

Foi também em 1969, quando o Brasil chafurdava no lamaçal de fardas da ditadura, que Leila Diniz provocou uma enorme polêmica no país. Em entrevista ao periódico alternativo Pasquim deu a primeira entrevista sobre intimidades da história do jornal, comprovando que de fato ela era a manifestante despudorada do prazer e uma das revolucionárias mais eficientes de uma época em que tabus e ideologias conservadoras foi amplamente questionadas. “Não gosto de convenções. Não tenho preconceitos. Não faço regimes”, dizia. No auge da repressão política no Brasil, ela pregou a liberdade feminina e o amor livre e em momento algum posou de moça recatada. “Você pode amar muito uma pessoa e ir para a cama com outra. Já aconteceu comigo”, revelou.

Suas declarações e idéias fizeram o jornal vender como nunca e a referida entrevista acabou entrando para a história não só pelas opiniões da entrevistada, mas por haver motivado a lei de censura prévia, apelidada de Decreto Leila Diniz, produzida pelo então ministro da Justiça, Alfredo Buzaid, cujo pretexto para justificar o seu ato foi o monte de palavrões que ela proferira ao longo da entrevista, apesar dos editores tê-los substituídos por 72 asteriscos. Em conseqüência, seu contrato com a Rede Globo não foi renovado e a ditadura passou a fazer pressão para que não mais a contratassem.

Entre 1970 e 1971, Leila Diniz conheceu o diretor Ruy Guerra, com o qual teve uma filha de nome Janaína. Apesar da paixão que os unia, cada qual continuou vivendo em sua própria casa. Em 1971, grávida de seis meses, escandalizou mais uma vez a sociedade brasileira ao aparecer de biquíni na praia de Ipanema. Suas fotos, com a barriga exposta e o rosto sorridente, de imediato tiveram ampla divulgação na imprensa. Afinal, o povo nunca tinha visto aquilo. O ineditismo incômodo do seu gesto levou-a a ser acusada por feministas de servir aos homens. Num contexto histórico de polarizações ideológicas, Leila Diniz era considerada artificial pela esquerda, enquanto a direita a acusava de imoral. Outro motivo de escândalo foi a atriz ter dado de mamar à filha, Janaína, no intervalo do espetáculo de teatro de revista que estrelava, VEM DE RÉ QUE VOU DE PRIMEIRA. No ano seguinte, o talento de Leila foi reconhecido no exterior: ela ganhou o prêmio de melhor atriz do Festival de Adelaide, na Austrália, com o filme MÃOS VAZIAS. Na viagem de volta ao Brasil, seu avião explodiu a 30 km de Nova Déli, na Índia. Ela morreu em 14 de julho de 1972, aos 27 anos, com nove de carreira e 14 filmes. Quem ficou de mãos vazias foi a rebeldia nacional.

Hoje em dia, uma grávida na praia, de biquíni, é coisa normal. Mulher nua na tela do cinema não espanta ninguém e, muito menos, alguém liga se ela fala palavrões ou dá de mamar em público. Mas, na década de 60, a sociedade era bem diferente. Se houve alguém que abriu caminho para que todos esses comportamentos – à época, escandalosos – se tornassem cotidianos, foi Leila Diniz, com a força do próprio exemplo. Ainda que, no auge da radicalização política, não fizesse apologia ao movimento feminista, ou carregasse qualquer bandeira. “Não morreria por nada deste mundo, porque eu gosto realmente é de viver. Nem de amores, eu morreria, porque eu gosto mesmo é de viver de amores” (Revista Fatos e Fotos – fevereiro de 1968).

Ao contrário, ela nunca deu a entender que desejava convencer ou converter alguém. Se, depois de sua morte, os movimentos feministas acabaram por transforma-la num símbolo da emancipação da mulher, foi porque suas atitudes sempre refletiram a convicção de que todo mundo tinha o direito de viver como quisesse. Ser careta, liberado, intelectual, casar virgem era uma questão de opção individual e particular.

Como escreveu Ruy Castro em ELA É CARIOCA: UMA ENCICLOPÉDIA DE IPANEMA (Companhia das Letras, 1999): “Leila se deixou julgar por um país inteiro para que ninguém mais julgasse ninguém”. A leveza com a qual encarava a vida não deixa de despertar uma ponta de inveja, o que me leva a dizer, parafraseando a Rita Lee, que todos nós, mulheres e homens, somos meio Leila Diniz, ao menos desejamos ser (por Coccinelle).

domingo, 9 de agosto de 2009

Homofobia ou estupidez?

Homofobia, como se sabe, é o ódio e/ou aversão ao modo de ser e estar homossexual. Por mais que tente, não consigo entender a razão da homossexualidade provocar esse sentimento naqueles que se dizem não-homossexuais. Para mim, a homofobia, além de torpe, é muito suspeita. Digo suspeita porque toda fobia resulta de um incômodo que, de acordo com o dicionário, significa tudo aquilo que não é confortável, que provoca embaraço, mal-estar ou aborrecimento. Se algo provoca em mim todas essas sensações, então, esse algo me toca de alguma maneira. Não nos incomodamos com nada que não nos diz respeito. No caso da homofobia, suspeito que esse incômodo nasça de uma atração que precisa ser negada para que o indivíduo atenda às expectativas instituídas pelas convenções sociais tradicionalmente sedimentadas. Tal negação por vezes se manifesta de forma violenta, por outras, de maneira sutil, como se pode perceber na matéria abaixo, de autoria do Fábio Altman, publicada na revista ISTOÉ DINHEIRO do dia 23/06/2004. Vejam só:

Há algo de podre no reino de William Shakespeare – podre talvez seja uma expressão um pouco exagerada. O fato é que na próxima semana, durante um encontro de shakespearianos em Londres, a escritora Robin Williams apresentará uma tese insólita – o bardo de Stratford era uma mulher. Quem? Mary Herbert, née Mary Sidney, a Condessa de Pembroke. Amante das artes, exímia tradutora, freqüentadora da corte de Elizabeth I, ela morreu em 1621 com fama de sumidade. Houve, claro, um William – mas ele teria sido testa-de-ferro de Mary. Se William foi Mary, como indica o polêmico estudo, isso explicaria o fato dos sonetos de amor de Shakespeare serem dedicados a um efebo. Explica, também, a dedicatória da primeira coleção de peças de teatro, para os condes de Pembroke e Montgomery, seus filhos. Tome-se a suposição como certeza para alimentar uma questão: saber que Shakeaspeare era ela, e não ele, muda alguma coisa no interesse por uma das marcas mais valiosas da história? As edições de Romeu e Julieta venderão menos por sabermos que a tragédia foi criada por mãos femininas? “Não altera nada do que ele escreveu, o que importa é a obra, que atravessou tempos e lugares”, diz Aimara da Cunha Rezende, uma das grandes especialistas brasileiras na obra do gênio inglês, presidente do Centro de Estudos Shakespeareanos do Brasil. Mas não há dúvida: a revelação acrescenta fermento numa figura lendária, tratado em tom quase religioso por seus adeptos.

Perceberam como ocorre a negação? Diz o Fábio Altman: “Se William foi Mary, como indica o polêmico estudo, isso explicaria o fato dos sonetos de amor de Shakespeare serem dedicados a um efebo”. Ora, ora, por que o William Shakespeare, sendo um homem, não poderia ter dedicado sonetos de amor a um efebo? Por qual razão é difícil aceitar que um dos maiores escritores da humanidade e da cultura ocidental era homossexual? Simples: HOMOFOBIA!

No tempo do Shakespeare as mulheres eram consideradas seres menores, inferiores aos homens. Consequentemente, tudo que viessem a produzir, sobretudo no campo das artes e das idéias, era considerado (quando considerado) algo menor, sem importância alguma. Sendo assim, produtores e editores se recusavam a publicar obras assinadas por mulheres. Daí muitas terem utilizado pseudônimos masculinos ou supostos testas-de-ferro, conforme foi dito na matéria do Fábio Altman. O que acabo de dizer não é novidade alguma. Evidentemente que o famoso William Shakespeare poderia ter sido um desses testas-de-ferro. A hipótese da pesquisadora/escritora Robin Williams é perfeitamente plausível. O que não é plausível é afirmar que o Sir William Shakespeare só poderia ter escrito sonetos de amor para rapazes se ele fosse, não um homem, mas, sim, uma mulher. Se isso não for homofobia, sem dúvida, é uma grande estupidez, afinal, somente uma mente tola ou doentia pode duvidar que homens sejam capazes de escrever cartas e/ou poemas de amor, ou até mesmo livros e peças teatrais inteiras, para outros homens (por Coccinelle).

domingo, 2 de agosto de 2009

Poema Falado: Sorri-Smile

Um poema é mais que um poema. Um poema é a senha que nos permite acessar o recôndito das almas, seja a alma de quem o escreve, seja a alma de quem o aprecia. Os poemas nos revelam. Vamos, pois, revelarmo-nos através dos poemas falados que doravante O cantinho de Coccinelle e outros dois blogs, o Bienvenue-Ami e o Salvador na sola do pé, apresentarão sempre no primeiro domingo de cada mês. Pretendemos formar uma rede tecida por versos e sons magníficos, afinal, como disse o Carlos Drummond de Andrade, “uma pessoa que tem hábitos intelectuais ou artísticos, uma pessoa que gosta de ler nunca está sozinha. Ela terá sempre uma companhia: a companhia imensa de todos os artistas, todos os escritores que ela ama, ao longo dos séculos”. Se quiser fazer parte dessa rede é só entrar em contato. O primeiro poema da série que hoje se inaugura é o Smile, letra composta por John Turner e Geoffrey Parsons para a música do Charles Chaplin. No Brasil ela foi lindamente traduzida por João de Barro, o Braguinha, nome fundamental da música brasileira. É esta tradução que aparece no vídeo abaixo. Boa leitura!

SORRI (SMILE)




Sorri quando a dor te torturar
E a saudade atormentar
Os teus dias tristonhos vazios

Sorri quando tudo terminar
Quando nada mais restar
Do teu sonho encantador

Sorri quando o sol perder a luz
E sentires uma cruz
Nos teus ombros cansados doridos

Sorri vai mentindo a tua dor
E ao notar que tu sorris
Todo mundo irá supor
Que és feliz!