domingo, 25 de janeiro de 2009

Reflexão

Nós nos movimentamos pela vida porque temos motivos para isso. Sem motivação não pode haver movimento. Sem movimento, não há vida (por Coccinelle).
*
E a vida o que é? Diga lá, Gonzaguinha!
*

domingo, 18 de janeiro de 2009

“Que receais de mim, visto que sou o impossível?” (Paul Claudel)

O que significa sensibilidade? É possível ter uma sensibilidade muito acentuada e ao mesmo tempo não ter nenhuma? A arte desenvolve a sensibilidade de quem a produz e de quem a contempla? Perguntas nem sempre possuem respostas. E se respostas há, elas por vezes são meras especulações, cujo mérito é tão somente o de nos fazer refletir.

De acordo com o dicionário Houaiss, a sensibilidade, no que diz respeito às emoções e às sensações humanas, é a faculdade de sentir compaixão pela humanidade, isto é, piedade, empatia pelo semelhante. Pode significar também a capacidade de captar e expressar sentimentos e coisas; ou, ainda, disposição especial para sentir ofensas e injúrias. Usualmente, tal disposição é denominada de melindre.

No dia-a-dia costumamos interpretar a sensibilidade da maneira como o dicionário a descreve. Porém, quando deixamos de lado a vida cotidiana para entrarmos no campo da filosofia, percebemos como as palavras podem ganhar outros significados, relacionados ou não à nossa rotina diária.

Para a filosofia, o termo sensibilidade possui quatro diferentes significados que se complementam. Sensibilidade pode ser a esfera das operações sensíveis do ser humano, considerada em seu conjunto. Isto inclui tanto o conhecimento sensível, quanto aos apetites, os instintos e as emoções. Pode significar também a capacidade de o indivíduo, ou de qualquer outro ser vivo, de receber e de reagir aos variados estímulos. Do mesmo modo pode ser a capacidade de julgamento ou avaliação em determinado campo, seja o moral, o artístico, entre outros. Por fim, sensibilidade se refere à capacidade de compartilhar as emoções alheias ou de simpatizar. Sendo assim, a pessoa sensível é aquela capaz de se comover com os outros. Já a pessoa insensível, ao contrário, é aquela que se mantém indiferente às emoções alheias (ver ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo, Martins Fontes, 2003).

Diante de tantos significados admissíveis, podemos dizer que é possível sim alguém possuir uma sensibilidade acentuada em relação a alguns fatos, estímulos ou pessoas, e, em relação a outros, comportar-se como uma muralha de gelo, que não derrete sequer frente ao calor intenso. Isso é natural, já que somos humanos e os seres humanos, como já escreveu o Walt Whitman (discorrerei sobre ele em uma outra ocasião), trazem dentro de si multidões infindas. Assim também é a alma de gênios fenomenais, a exemplo do Auguste Rodin.

Nascido em Paris aos 12 de novembro de 1840 e falecido em Meudon aos 17 de novembro de 1917, François-Auguste-René Rodin foi um dos escultores mais magnificamente geniais da história da arte. Não me refiro apenas à arte contemporânea, mas à arte de todos os tempos. Como aconteceu a outros grandes artistas, a primeira obra de Rodin, O Homem de Nariz Quebrado (1864), não foi aceita no Salon de Paris. O júri justificou a recusa, alegando se tratar de um esboço, isto é, uma obra inacabada. O curioso é que Rodin se consagraria justamente por criar obras a partir do conceito de “non finito”. Em 1875, Rodin realizou uma viagem à Itália. Lá se interessou principalmente pela obra de Michelangelo, mais precisamente pela escultura O Prisioneiro, que o mestre renascentista deixou inacabada. De acordo com biógrafos, esta influência o teria libertado do academicismo da época e aberto caminho para altos vôos criativos que marcariam definitivamente a história da arte.

Quando Rodin já era um renomado mestre das artes plásticas ele conheceu a jovem Camille Claudel (1864-1943), provavelmente, sua aprendiz mais ardente. Ela tinha 19 anos e talvez impulsionada pelo fascínio que geralmente os mestres exercem sobre seus discípulos, tornou-se amante do genial escultor, um homem no auge da maturidade, com 43 anos. Apesar de Camille ofertar a Rodin o que ela tinha de melhor em si, e de mais belo também, ele, ainda assim, recusou. Justo Rodin, que se consagraria através do belo. E quão belo é o belo que suas mãos produziram! Embora tocado pelo amor da jovem amante, como demonstram as correspondências que eles trocaram, Rodin não fora capaz de abandonar sua esposa. Por medo, insegurança ou insensibilidade, ele desprezou toda a beleza que a Camille lhe ofereceu. E ela, desesperada, amargou o abandono e a indiferença. Em uma de suas cartas escreveu: “Durmo nua todas as noites na ilusão de que está a meu lado, mas quando acordo já não é mais a mesma coisa”.
*
A indiferença por vezes pode ferir mais que o ódio. Ferida, Camille caiu. E assim caída, Camille se arrastou pela vida até enlouquecer. Em março de 1913, poucos dias após a morte do pai, seu porto seguro, Camille foi internada no manicômio de Ville-Evrard. Com a deflagração da Primeira Guerra Mundial, ela foi transferida para Villeneuve-lès-Avignon onde morreu aos 19 de outubro de 1943, após trinta anos de internação. Seu irmão, o diplomata, dramaturgo e poeta francês, Paul Louis Charles Claudel (1868-1955), sentiu um enorme remorso por ter permitido que ela fosse internada em um hospício durante três décadas. Seu arrependimento o levou, ao fim da vida, a se tornar um dos principais divulgadores da obra da genial irmã. Talvez um dia eu também enlouqueça como a Camille Claudel (por Coccinelle).

Reflexão

“A imaginação, o sentimento, o imprevisto que surge do espírito desenvolvido é proibido para eles, cabeças fechadas, cérebros obtusos eternamente negados a luz” (Camille Claudel).
*
*
“A felicidade não é um luxo: está em nós como nós próprios” (Paul Claudel).

Camille Claudel – o filme

Sinopse – Em Paris, em 1885, a jovem escultora Camille Claudel entra em conflito com sua família burguesa ao tornar-se aprendiz e, depois, assistente do famoso Auguste Rodin. Quando ela se transforma em amante do mestre (que já é casado), cai em desgraça junto à sociedade parisiense, embora tenha amigos do porte do compositor Claude Debussy. Depois de quinze anos de tortuoso relacionamento com Rodin, Camille rompe o romance e mergulha cada vez mais na solidão e na loucura. Por iniciativa de seu irmão mais novo, o escritor Paul Claudel, é internada em 1912 num manicômio.
*
Comentário – Ao lado de Adèle Hugo e da rainha Margot, Camille Claudel configura-se como um dos papéis mais desafiadores na carreira de Isabelle Adjani, cujo talento e beleza de porcelana fizeram-na a atriz ideal para o papel de personagens trágicos. Além de atuar, ela foi uma das co-produtoras do filme dirigido pelo estreante Bruno Nuytten, co-autor do roteiro, adaptado do romance de Reine-Marie Paris. Na equipe técnica, destaca-se o trabalho de Néstor Almendros, responsável pela fotografia. A bela canção Spleen, composta por Claude Debussy a partir de poema homônimo de Paul Verlaine, é interpretada pela soprano norte-americana Barbara Hendricks. Um filme estupendo que deve ser visto pelos amantes da arte em geral, do cinema em particular, da Camille Claudel e da belíssima Isabelle Adjani (Fonte: internet).
*
Isabelle Adjani como Camille Claudel (um trecho do filme)
*

domingo, 11 de janeiro de 2009

O silêncio das sereias

Comprovação de que mesmo meios insuficientes, e até infantis, podem conduzir à salvação.

A fim de proteger-se das sereias, Ulisses entupiu os ouvidos de cera e mandou que o acorrentassem com firmeza ao mastro. É claro que, desde sempre, todos os outros viajantes teriam podido fazer o mesmo (a não ser aqueles aos quais as sereias atraíam já desde muito longe), mas o mundo todo sabia que de nada adiantava fazê-lo. O canto das sereias impregnava tudo -- que dirá um punhado de cera --, e a paixão dos seduzidos teria arrebentado muito mais do que correntes e mastro. Nisso, porém, Ulisses nem pensava, embora talvez já tivesse ouvido falar a respeito; confiava plenamente no punhado de cera e no feixe de correntes, e, munido de inocente alegria com os meiozinhos de que dispunha, partiu ao encontro das sereias.

As sereias, porém, possuem uma arma ainda mais terrível do que seu canto: seu silêncio. É certo que nunca aconteceu, mas seria talvez concebível que alguém tivesse se salvado de seu canto; de seu silêncio, jamais. O sentimento de tê-las vencido com as próprias forças, a avassaladora arrogância daí resultante, nada neste mundo é capaz de conter.

E, de fato, essas poderosas cantoras não cantaram quando Ulisses chegou, seja porque acreditassem que só o silêncio poderia com tal opositor, seja porque a visão da bem-aventurança no rosto de Ulisses -- que não pensava senão em cera e correntes -- as tenha feito esquecer todo o canto.

Ulisses, contudo, e por assim dizer, não ouviu-lhes o silêncio; acreditou que estivessem cantando e que somente ele estivesse a salvo de ouvi-las; com um olhar fugaz, observou primeiro as curvas de seus pescoços, o respirar fundo, os olhos cheios de lágrimas, a boca semi-aberta; mas acreditou que tudo aquilo fizesse parte das árias soando inaudíveis ao seu redor. Logo, porém, tudo deslizou por seu olhar perdido na distância; as sereias literalmente desapareceram, e, justo quando estava mais próximo delas, ele já nem mais sabia de sua existência.

Elas, por sua vez, mais belas do que nunca, esticavam-se, giravam o corpo, deixavam os cabelos horripilantes soprar livres ao vento, soltando as garras na rocha; não queriam mais seduzir, mas somente apanhar ainda, pelo máximo de tempo possível, o reflexo dos grandes olhos de Ulisses.

Se as sereias tivessem consciência, teriam sido aniquiladas então; mas permaneceram: Ulisses, no entanto, escapou-lhes.

Dessa história, porém, transmitiu-se ainda um apêndice. Diz-se que Ulisses era tão astuto, uma tal raposa, que nem mesmo a deusa do destino logrou penetrar em seu íntimo; embora isto já não seja compreensível ao intelecto humano, talvez ele tenha de fato percebido que as sereias estavam mudas, tendo então, de certo modo, oferecido a elas e aos deuses toda a simulação acima tão-somente como um escudo.

Franz Kafka, 23 de outubro de 1917.

Original alemão extraído de Franz Kafka. Beim Bau der chinesischen Mauer und andere Schriften aus dem Nachlaß (in der Fassung der Handschrift), Frankfurt am Main, Fischer Taschenbuch Verlag (12446), November 1994, S. 168-170. Edições anteriores intitulavam-no "Das Schweigen der Sirenen" [O silêncio das sereias], título que, no entanto, lhe foi dado por Max Brod.

sábado, 10 de janeiro de 2009

Fenômeno fenomenal

Existem diversos tipos de fenômeno. Dos naturais aos políticos, passando pelos econômicos e de interesse científico. Mas aqui vou falar dos indivíduos cujas raras qualidades os fazem ser fenomenais, isto é, excepcionais e admiráveis, seja por seus feitos ou atitudes.
*
Os Jogos Olímpicos de Beijing (2008), assim como os anteriores, apresentaram ao mundo atletas fenomenais. O maior de todos, pode-se dizer, foi o nadador Michael Phelps. Nascido aos 30 de Junho de 1985, em Baltimore-EUA, Michael Fred Phelps II é hoje o maior atleta olímpico de todos os tempos. Em Beijing quebrou vinte e oito recordes mundiais e conquistou o maior número de medalhas de ouro (oito) numa só edição na história dos Jogos Olímpicos, totalizando dezesseis medalhas em três edições dos Jogos Olímpicos dos quais participou, Sydney (2000), Atenas (2004) e Beijing (2008). Com esse total, só lhe falta o recorde olímpico absoluto, pertencente à ginasta da ex-União Soviética, Larissa Latynina, com dezoito. Isso sim é fenômeno! Aliás, olhando bem o corpanzil do gajo, não se pode negar que ele seja mesmo um fenômeno! E que fenômeno!
*
Outro atleta fenomenal que Beijing revelou ao mundo em 2008 foi o australiano Matthew Mitcham. Com muita precisão, técnica e habilidade, o jovem atleta das piscinas de apenas 20 anos conquistou nos saltos ornamentais uma medalha de ouro nos Jogos Olímpicos da China. Como assim uma?! Se o compararmos ao Michael Phelps isso não é nada! Calma, nem todos se tornam fenomenais pelos mesmos motivos. Não que ganhar uma medalha nos Jogos Olímpicos, seja de ouro prata ou bronze, não seja por si só algo fenomenal. Estar entre os melhores dentre os melhores do mundo não é um feito para qualquer um. Entretanto, o jovem Matthew Mitcham se destacou também por suas atitudes fora das raias. Ele foi o único atleta homossexual assumido a atuar nessa última edição dos Jogos Olímpicos. De acordo com a revista Época (30/05/2008), o rapaz, poucas semanas antes dos Jogos, “assumiu ser gay numa entrevista para um jornal de Sydney e contou que quase se aposentou das piscinas quando era adolescente por causa de uma profunda depressão. Quem o ajudou a renascer na profissão nove meses depois foi seu namorado, Lachlan”. O jovem atleta também andou criticando o primeiro ministro australiano, Kevin Rudd, por ele achar que o casamento deve acontecer tão somente entre um homem e uma mulher. “Essa opinião é digna de uma pessoa com a mente fechada”, declarou o rapaz. Santa atitude, Batman! Pois é, ser fenomenal não é para qualquer um. Mas está ao alcance de todos. (por Coccinelle).

domingo, 4 de janeiro de 2009

Os astros não mentem jamais - previsões para 2009

As previsões abaixo, elaboradas a partir de cuidadosos estudos astrológicos, foram enviadas pelo acefálico colaborador Ernest Cutolo, de Curitiba. Coccinelle agradece a valiosa contribuição. Valeu!

ÁRIES – Os astros revelam que os nativos de Áries não conseguirão manter o casamento até o fim do ano. E não adianta fazer cara de espanto ou sair por aí dando cabeçada. Assim você só vai conseguir ruga e muita dor de cabeça.

TOURO – Não importa as origens. Os nativos de Touro nasceram para carregar chifres. Que fazer? É o destino. Mas aprenda a enxergar o lado positivo da coisa: ainda bem que seus chifres são ocos e não ramificados. Já pensou se fossem iguais aos do alce?!

GÊMEOS – Não adianta ter duas caras se ambas são horrorosas. Vê se abre essa mão e corre para fazer uma cirurgia plástica. Quem sabe assim você desencalha.

CÂNCER – Os nativos de Câncer não têm com o que se preocupar. Infelizmente, os cientistas ainda não descobriram um meio eficaz de nos livrarmos definitivamente de gente chata.

LEÃO – Os nativos de Leão continuam pensando que são os reis do pedaço. Mas o que as leoninas andam dizendo por aí é que o rugido deles não passa de um reles miado. Cuidado para não acabar virando touro em 2009!

LIBRA – Os nativos de Libra devem fazer uma dieta rigorosa o mais urgente possível, caso contrário a balança não vai suportar tanto peso e acabará quebrando.

VIRGEM – De todos os signos do zodíaco, este é o único que corre sérios riscos de extinção já em 2009. O pessoal do GREENPEACE e da WWF já se mobilizou para acelerar o extermínio da espécie. Aqui no Brasil o IBAMA resolveu dar uma forcinha.

ESCORPIÃO – Os astros revelam que os nativos de Escorpião terão sérias complicações com o rabo em 2009. Só não revelaram que tipo de complicação.

SAGITÁRIO – Esse ar meio selvagem dos nativos de Sagitário fará grande sucesso em 2009. Mas nada de exageros para o pessoal do IBAMA não lhe confundir com uma paca e acabar lhe confiscando.

CAPRICÓRNIO – Os astros dizem que os nativos de Capricórnio devem parar de se comportar como se fossem as pessoas que mais sofrem no mundo. Existem chifres bem maiores.

AQUÁRIO – Os nativos de Aquário geralmente costumam ser admirados pela graça que possuem. Mas toda essa graça só serve para olhar, nada mais. Portanto, se continuar insistindo nessa cara de aquário, vai acabar se afogando no próprio.

PEIXES – Tá certo que os nativos de Peixes adoram o mar. Mas isso não significa que devam cheirar a bacalhau. Vê se toma banho com mais freqüência, caso contrário passará o ano a ver navios. Captou?

Ir Além


Além do mundo onde as coisas são concebidas pelo olhar de nossa mente existem outros mundos que estão além da nossa usual percepção. Nesse além habitam as Joaninhas, pequeninas feito um átimo de respiro, com suas pintas de formas variadas como impressões digitais. De espírito irrequieto, elas jamais cessam de voltear entre girassóis e margaridas de pétalas multicoloridas. Para enxergá-las, é preciso ir além dos conceitos e tradições, pois entre o isto ou aquilo simplesmente há um universo imenso que está além de qualquer conhecimento passado, presente ou futuro. Está além mesmo das multidões de qualquer gênero. Joaninhas não se prendem a amarras conceituais. Elas têm asas. E quem tem asa voa. Voa como pode e se pode nunca deixa de voar. Por isso estou aqui e acolá, cada vez mais livre, enfim, e com disposição para descolar-me. Haja céu, nuvens e jardins (por Coccinelle).

Coming (David Motion, Sally Potter e Jimmy Sommerville)

Outro dia me perguntaram sobre quem é Coccinelle. Muitos não entendem porque presos estão, ainda, a padrões conceituais cunhados em passado remoto. Para esclarer, segue a tradução da música COMING, tema do filme ORLANDO (1992), dirigido por Sally Potter. Essa música é a tradução de Coccinelle.
*
A CHEGAR - "Estou a chegar! Estou a chegar! A chegar além! Além de toda e qualquer divisão! Nesse momento de união / Sinto uma enorme euforia / Por estar aqui, agora / Livre, enfim / Sim, livre estou / De tudo o que já passou / E do porvir que acena para mim / Estou a chegar! Estou a chegar! Aqui estou! Nem mulher, nem homem / Somos todos tão somente / Uma única humana face / Somos todos simplesmente / Uma única face humana / Estou na Terra / E também fora dela / Estou a nascer e a morrer".
*
Tradução: Coccinelle